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domingo, 24 de abril de 2022

Escrito por em 24.4.22 com 0 comentários

Defensores da Terra

Defensores da Terra era um dos meus desenhos preferidos na infância, principalmente porque minha mãe, que me fez fã de ficção científica e fantasia, era fã do Fantasma, chegando até a colecionar alguns quadrinhos dele quando era solteira, e eu achava legal assistir a um desenho que tinha um personagem do qual ela gostava. Há muito tempo já eu penso em fazer um post sobre ele - desde 2011, quando fiz vários sobre desenhos dos anos 1980 - mas as informações sobre o desenho dariam um post minúsculo, algo que nunca me agradou. Pensei em fazer dupla com outro, mas essa ideia não me agradava. Enquanto escrevia o post sobre Galaxy Rangers e BraveStarr, porém, tive uma ideia daquelas que a gente se pergunta como foi que não teve antes: ao invés de falar somente sobre o desenho, vou falar um pouco, também, sobre seus personagens.

Ok, essa ideia pode parecer, na verdade, a constatação mais óbvia do mundo, mas nesse caso é uma grande ideia, porque Defensores da Terra, se alguém não está ligando o nome às pessoas, é aquele desenho que reúne quatro dos maiores heróis dos quadrinhos da King Features Syndicate: Flash Gordon, o Fantasma, Mandrake e Lothar. A King não é uma editora de revistas em quadrinhos, como a Marvel e a DC, o que significa que esses personagens não são originários de revistas em quadrinhos, e sim de tiras de jornal. Nos Estados Unidos, tiras de jornal não são produzidas pelos próprios jornais, e sim por "distribuidoras", que, em sua essência, são editoras, contratando roteiristas, desenhistas, arte-finalistas, letristas, e todos os demais profissionais necessários para a produção de uma história em quadrinhos. Essas distribuidoras produzirão as tiras e as negociarão com os diversos jornais do país; os que se interessam pagam uma taxa mensal, e, em troca, recebem todos os dias uma tira do personagem escolhido para incluir em sua publicação. O catálogo de cada distribuidora é extremamente diversificado; no da King, a maior do país, estão presente tiras infantis (Dênis, o Pimentinha), de comédia (Hägar, o Horrível), educativas (Mark Trail), e, é claro, de ação e aventura, como a do Fantasma. Nem todas as tiras são produzidas pelos contratados da própria distribuidora, que atua, também, comprando tiras de outras editoras e as repassando aos jornais; no passado, a King fez isso com as tiras do Pato Donald, da Betty Boop, do Archie, e até mesmo do Homem-Aranha, produzida pela Marvel. Quase todas as distribuidoras têm a palavra syndicate no nome, mas não têm nada a ver com sindicatos (que, em inglês, são unions), com esse nome, na época em que elas foram fundadas, sendo usado com o significado de "cooperativa", já que, inicialmente, os próprios artistas se reuniam e fundavam uma distribuidora - obviamente, faz tempo que isso já não é assim, com as distribuidoras hoje sendo parte de grandes conglomerados de empresas; a King, por exemplo, faz parte da multinacional Hearst Communications.

Pois bem, antes que eu digressione demais, vamos falar sobre Defensores da Terra - apresentando, primeiro, seus quatro heróis principais!

Flash Gordon foi criado em 1934 por Alex Raymond, para competir com outro herói de temática espacial, Buck Rogers. Rogers foi criado originalmente para a história Armageddon 2419 A.D., publicada na edição de agosto de 1928 da revista Amazing Stories, e seu grande sucesso logo faria com que ele fosse adaptado para uma novela de rádio, um filme para o cinema e uma tira de jornal, publicada pela primeira vez em 7 de janeiro de 1929. A tira era escrita pelo mesmo autor da história original, Philip Francis Nowlan, e desenhada por Dick Calkins; sua distribuição ficaria a cargo da National Newspaper Syndicate, na época de propriedade de John F. Dille, que negociaria os direitos de publicação diretamente com Nowlan.

Buck Rogers in the 25th Century A.D. logo se tornaria uma das tiras de jornal de maior sucesso dos Estados Unidos, gerando várias imitações, inclusive Speed Spaulding, também publicada pela National Newspaper Syndicate. No início da década de 1930, a King Features Syndicate já era a maior distribuidora de tiras de jornal dos Estados Unidos, e, evidentemente, não podia ficar para trás. A princípio, a King tentaria conseguir os direitos de John Carter, para fazer uma tira inspirada nos livros escritos por Edgar Rice Burroughs, mas, como não conseguiu chegar a um acordo, recorreu a Raymond, que já era um roteirista e desenhista da casa, na época responsável pelos desenhos de Secret Agent X-9, para que ele criasse um personagem original, inspirado em Rogers. A criação de Raymond faria tanto sucesso que ele hoje é considerado um dos maiores autores de ficção científica de todos os tempos, mesmo sem jamais ter publicado um único livro ou escrito para revistas especializadas.

A história começa quando cientistas descobrem que o planeta Mongo está em curso de colisão com a Terra. Para tentar impedir a catástrofe, o Dr. Hans Zarkov, professor na Universidade de Yale, cria um foguete capaz de chegar a Mongo antes que ele chegue à Terra, mas, enlouquecido, sequestra um de seus alunos, Flash Gordon, jogador de polo atlético, popular e bonitão, e sua namorada, Dale Arden. Quando o foguete chega a Mongo, Flash descobre que a colisão era um plano de seu governante, Ming, o Impiedoso, e consegue impedi-la, destruindo a máquina que Ming estava usando para mover o planeta. Flash, Dale e o Dr. Zarkov, então, ficam em Mongo, sendo caçados pelas tropas de Ming, e ajudando rebeldes a confrontá-lo. Vale dizer que, apesar de a arte de Raymond ser claramente futurista, a tira não dá qualquer indicação de que seja ambientada no futuro - inclusive, na primeira tira são mostrados veículos e aparelhos próprios da década de 1930.

Ao longo dos anos, Flash viajaria por várias regiões de Mongo, como o Reino de Arbórea, governado pelo Príncipe Barin, legítimo herdeiro do trono usurpado por Ming e namorado da filha de Ming, Aura; o reino gelado de Frígia, governado pela Rainha Fria (cujo nome é esse mesmo em inglês, Queen Fria); o reino selvagem de Trópica, governado pela Rainha Desira; o Reino Submarino dos homens-tubarão, governado pelo Rei Kala; o Reino da Savana dos homens-leão, governada pelo Príncipe Thun; e a mais famosa de todas, a cidade voadora dos homens-gavião, governada pelo Príncipe Vultan. Depois de alguns anos de aventuras, Ming é derrotado, Barin assume o trono, e Flash e seus amigos passam a viajar entre a Terra e Mongo constantemente, vivendo aventuras em ambos os planetas. A partir da década de 1950, Flash também passaria a viajar para outros planetas, usando espaçonaves de aspecto futurista e mais velozes que a luz, e enfrentando diferentes vilões. Uma das sagas mais famosas seria a das Guerras Skorpianas, que introduziria o Barão Dak-Tula, que se tornaria um dos principais vilões da história a partir da década de 1970.

A tira de Flash Gordon estrearia em 7 de janeiro de 1934, exatos cinco anos após a de Buck Rogers. Ela logo se tornaria um sucesso ainda maior que a de Rogers, sendo publicada não só nos principais jornais dos Estados Unidos, mas também internacionalmente - no final da década de 1930, Flash Gordon já era publicado em mais de 130 jornais, em oito idiomas, e tinha uma estimativa de 50 milhões de leitores. Inicialmente, a tira era publicada apenas aos domingos, a cores, com roteiro e arte de Raymond; em 1941, a King decidiria lançar também uma tira diária, em preto e branco, com arte de Austin Briggs. Em 1944, Raymond, que era reservista dos Fuzileiros Navais, seria convocado para lutar na Segunda Guerra Mundial, e a tira diária seria cancelada para que Briggs pudesse ser roteirista e desenhista da tira dominical. Raymond retornaria em 1946, mas a King decidiria manter a tira de Flash Gordon com Briggs, e faria um acordo para que ele criasse uma nova tira; Raymond, então criaria o detetive particular Rip Kirby, mas preferiria ficar apenas como desenhista, com os roteiros ficando com Ward Greene. Raymond faleceria em um acidente de carro em 1956, e John Prentice assumiria Kirby, sendo seu desenhista e roteirista até ele também falecer, em 1999.

Enquanto isso, a tira dominical de Flash Gordon ficaria com Briggs até 1948, quando ele seria contratado para ser ilustrador da Reader's Digest; ela então passaria para Mac Raboy, que seria seu desenhista e roteirista até 1967. Em 1951, a King decidiria relançar a tira diária, mas com uma história independente da dominical, inicialmente com Dan Barry como roteirista e desenhista. Harry Harrison seria o roteirista entre 1958 e 1964, ainda com Barry como desenhista, com Barry retornando a acumular ambas as funções após sua saída. Após a saída de Raboy, Barry assumiria também a tira dominical, o que faria com que, a partir de 1967, tanto a tira diária quanto a dominical seguissem a mesma história. Barry seria o autor mais longevo de Flash Gordon, somente deixando a tira em 1990, quando seria substituído pelo roteirista Bruce Jones e pelos desenhistas Ralph Reese (tira diária) e Gray Morrow (tira dominical). Já no ano seguinte, 1991, o trio daria lugar ao roteirista Thomas Warkentin e ao desenhista Andrés Klacik. Em 1992, a tira diária seria definitivamente cancelada, mas a dominical seguiria com uma equipe composta por Warkentin, Klacik, e os roteiristas e desenhistas Richard Brunning e Kevin Van Hook até 1996, quando Jim Keefe assumiria como único roteirista e desenhista. Ao longo desses anos todos, algumas tiras contaram com roteiristas e desenhistas convidados, incluindo Harvey Kurtzman, Frank Frazetta, Al Williamson, Bob Fujitani, Jack Davis, Sy Barry, Fred Kida, Emil Gershwin, John Romita e Joe Kubert. A última tira inédita seria publicada em 3 de julho de 2003; até hoje, porém, jornais do mundo inteiro republicam as tiras antigas, principalmente as de Keefe.

As tiras criadas por Raymond são hoje consideradas como algumas das histórias em quadrinhos de melhor roteiro e melhor arte de todos os tempos, e seriam bastante influentes em outras obras de ficção científica e fantasia. Jerry Siegel e Joe Shuster, os criadores do Superman, eram fãs de Flash Gordon, assim como Dennis Neville, que se inspirou no povo-gavião para criar o herói Gavião Negro. Um dos filmes de ficção científica de maior sucesso da década de 1960, Barbarella, seria adaptação de uma história em quadrinhos francesa, criada por Jean-Claude Forest, que decidiria fazer uma "versão adulta" de Flash Gordon. Até mesmo Star Wars teve grande influência de Flash Gordon, mas dos seriados feitos para o cinema, e não dos quadrinhos.

Ah, sim, falando nisso, o grande sucesso das tiras de Flash Gordon fariam com que o herói migrasse para as telas do cinema ainda na década de 1930, com o lançamento de três serials - seriados filmados em película e exibidos nos cinemas, por vezes em sessões próprias, por vezes antes de algum outro filme. O primeiro se chamaria simplesmente Flash Gordon, e seria lançado em 1936, com 13 episódios; em seguida viriam Flash Gordon's Trip to Mars (1938, 15 episódios) e Flash Gordon Conquers the Universe (1940, 12 episódios). Os três seriam filmados pela Universal, em preto e branco, e contariam com Buster Crabbe como Flash Gordon, Charles B. Middleton como Ming e Frank Shannon como o Dr. Zarkov; Dale é interpretada nos dois primeiros por Jean Rogers e no terceiro por Carol Hughes, e Barin nos dos primeiros por Richard Alexander e no terceiro por Roland Drew. Na década de 1940, cada um dos três seria condensado, editado e relançado como um filme.

Mas o filme mais famoso com Flash Gordon é o de 1980, dirigido por Mike Hodges, escrito por Lorenzo Semple Jr., produzido pelo lendário Dino de Laurentiis e com trilha sonora composta pelo Queen. De Laurentiis adquiriria os direitos para adaptar Flash Gordon na década de 1960, mas o projeto passaria anos suspenso; diz a lenda que George Lucas tentaria adquiri-los de de Laurentiis na década de 1970, e decidiria fazer Star Wars após não conseguir. Antes de Hodges, de Laurentiis convidaria para a direção Federico Fellini, que não aceitou, e Nicolas Roeg, que seria demitido por estar fazendo o filme "muito sério". Apesar de bem fiel aos quadrinhos, o filme possui, por exigência de de Laurentiis, um tom humorístico semelhante ao da série do Batman (com Adam West e Burt Ward, da qual Semple também era roteirista), e, por isso, não costuma ser muito bem-visto pelos fãs. No filme, Ming (Max von Sydow) decide destruir a Terra causando desastres naturais, dentre eles fazer com que a Lua saia de sua órbita e se choque contra o planeta; Flash (Sam J. Jones) é um jogador de futebol americano (do New York Jets) que está viajando com sua agente, Dale Arden (Melody Anderson), quando o avião é atingido por um meteoro, parte do ataque de Ming, e faz um pouso de emergência na estufa do Dr. Hans Zarkov (Topol), que construiu uma espaçonave para ir investigar a fonte dos desastres, e engana Flash e Dale para que vão com ele. Além de von Sydow e Topol, que eram grandes astros na época, o filme conta com a participação de vários atores do primeiríssimo time, como Ornella Muti (Princesa Aura), Timothy Dalton (Príncipe Barin), Brian Blessed (Príncipe Vultan), Peter Wyngarde (General Klytus, o comandante das tropas de Ming, criado exclusivamente para o filme) e George Harris (Príncipe Thun). Jones se desentenderia com de Laurentiis durante as filmagens, e as abandonaria durante a pós-produção; não se sabe se por implicância ou por algum problema de gravação, vários de seus diálogos seriam regravados pelo dublador Peter Marinker. Filmado na Inglaterra, o filme seria um grande sucesso na Europa, mas um fracasso nos Estados Unidos; a crítica o receberia bem e, nos anos seguintes, ele se tornaria cult. O filme ganharia uma adaptação em quadrinhos, com roteiro de Bruce Jones e arte de Al Williamson, uma versão em romance, escrita por Arthur Byron Cover, um game para o Atari 2600 e uma máquina de pinball.

Na televisão, Flash já foi astro de quatro séries. A primeira teria 39 episódios de 30 minutos cada em preto e branco, exibidos entre 15 de outubro de 1954 e 15 de julho de 1955, e contaria com Steve Holland como Flash, Irene Champlin como Dale, e Joseph Nash como o Dr. Zarkov. Essa série ficaria famosa por dois motivos: primeiro, ela não tinha nada a ver com os quadrinhos, sendo ambientada no ano 3203 e mostrando o trio viajando pela galáxia em uma nave espacial e enfrentando vários vilões genéricos; segundo, ela seria filmada em Berlim menos de dez anos após o fim da Guerra, mostrando como a cidade foi devastada pelo conflito. Entre 22 de setembro de 1979 e 6 de novembro de 1982, seria exibida, em duas temporadas de 16 episódios cada, As Novas Aventuras de Flash Gordon, criada pela famosa dupla Norm Prescott e Lou Scheimer, que inicialmente seria filmada com atores, mas, para cortar custos, acabaria sendo uma série de animação; essa seria mais fiel aos quadrinhos, mas também ficaria mais infantil. Em 1982, o famoso estúdio Filmation produziria um filme de animação para a TV, chamado Flash Gordon: The Greatest Adventure of All, ambientado durante a Segunda Guerra Mundial; esse filme seria feito a partir de um roteiro não utilizado para a série, no qual Ming decide ajudar Hitler a ganhar a guerra. Em 1996 seria lançada uma nova série animada, de 26 episódios, na qual Flash e Dale são adolescentes e praticam esportes radicais. A série mais recente seria produzida pelo canal Sci-Fi, teria 21 episódios de uma hora cada exibidos entre 10 de agosto de 2007 e 8 de fevereiro de 2008, e contaria com Eric Johnson como Flash, Gina Holden como Dale, Jody Racicot como o Dr. Zarkov, e John Ralston como Ming.

Flash também seria astro de duas novelas de rádio, a primeira transmitida entre 22 de abril e 26 de outubro de 1935, a segunda entre 28 de outubro de 1935 e 6 de fevereiro de 1936, ambas inspiradas nas tiras dos jornais mas com histórias diferentes; de um musical de teatro infantil, que estreou em 1989; e de duas séries de livros, a primeira voltada para o público infanto-juvenil, com 15 títulos publicados pela Whitman entre 1934 e 1948, e a segunda voltada para o público adulto, com 6 títulos publicados em 1973 pela Avon Books. Um romance baseado na saga dos quadrinhos As Cavernas de Mongo seria publicado em 1936 pela Grosset & Dunlap, e uma revista com contos estrelados pelo herói, chamada Flash Gordon Strange Adventure Magazine seria publicada no mesmo ano pela Harold Hersey. Finalmente, Flash Gordon seria astro, ao longo dos anos, de várias revistas em quadrinhos, a maioria delas republicando as tiras dos jornais; as mais notáveis exceções são uma minissérie de nove edições lançada pela DC em 1988, com roteiro e arte de Dan Jurgens, e um especial da Marvel em duas edições, com roteiro de Mark Schultz e arte de Al Williamson, lançadas em 1995.

Mandrake, o Mágico é do mesmo ano que Flash Gordon, mas foi criado por Lee Falk. Um mágico de palco que secretamente possui poderes, ao invés de usar apenas truques, Mandrake (cujo nome em inglês, pronunciado "mendrêik", significa mandrágora, planta historicamente relacionada à bruxaria e à feitiçaria) é considerado o primeiro super-herói das histórias em quadrinhos, e estrearia em uma tira diária (de segunda a sábado em preto e branco, aos domingos em cores) escrita e desenhada por Falk em 11 de junho de 1934; poucas semanas depois, Phil Davis assumiria como desenhista, ficando Falk, que trabalhava em outras tiras da King, apenas como roteirista. Davis faleceria repentinamente de ataque cardíaco em 1964, e seria substituído nos roteiros por Fred Fredericks, escolhido pessoalmente por Falk. Fredericks e Falk seriam a dupla responsável pela tira até 1999, quando Falk faleceria, aos 87 anos; Fredericks, então, ficaria responsável pelos roteiros e desenhos até decidir se aposentar, em 2013, quando a King decidiria cancelar a tira de Mandrake - que já estava sendo publicada apenas de segunda a sábado desde 2002, quando a dominical foi cancelada. A última tira inédita de Mandrake seria publicada em 6 de julho de 2013; assim como ocorre com Flash Gordon, muitos jornais ainda republicam as antigas, especialmente as originalmente publicadas a partir de 1995.

Falk criaria Mandrake na infância, e tinha apenas 23 anos quando o ofereceu à King; ele sempre foi apaixonado por números de mágica, e se inspiraria em sua própria aparência - magro, cabelos penteados para trás, bigode fino - para criar a do herói, dando a ele o uniforme que se tornaria o estereótipo de mágico nos quadrinhos: fraque, cartola, capa e bengala. A aparência e o gestual de Mandrake influenciariam praticamente todos os mágicos criados para os quadrinhos depois dele, sendo o mais famoso Zatara, o pai da feiticeira Zatanna, da DC. Curiosamente, na década de 1930 havia um mágico, chamado Leon Giglio, que se parecia fisicamente com Mandrake e se apresentava com uma roupa semelhante - inclusive com uma capa de fundo vermelho, que, na época, não era comum, mas depois se tornou a "capa de mágico" - e, por publicidade, depois da estreia da tira, começaria a declarar que Falk havia se inspirado nele para criar o personagem. Giglio chegaria a passar a trabalhar com o nome artístico de Leon Mandrake, atraindo grande público; apesar de declarar em entrevistas que ele não foi a fonte de sua inspiração, Falk nunca tomou nenhuma ação para impedi-lo, achando tudo muito divertido.

Nos quadrinhos, Mandrake é um mestre do hipnotismo; através de gestos rápidos e quase imperceptíveis, ele consegue hipnotizar qualquer pessoa em segundos, normalmente usando esse poder para que seus alvos enxerguem ilusões ou pensem que ele está invisível - e nunca para controlar suas mentes. Em algumas histórias, Mandrake demonstra possuir outros poderes, como o de mudar de forma, levitar ou se teletransportar, e em algumas ocasiões é deixado subentendido que ele envelhece mais lentamente que uma pessoa normal, podendo já ter uma centena de anos. Apesar de todos os poderes serem dele mesmo, sua cartola, capa e varinha também são itens mágicos, que ele recebeu de seu pai, Theron, que também era um mágico, e que ele pode usar para feitiços ainda mais poderosos. Mandrake vive em uma fortaleza de alta tecnologia, chamada Xanadu, no topo de uma montanha no norte do Estado de Nova Iorque, e, para todos os efeitos é um mágico de palco comum; quando não está se apresentando, ele atua como detetive, desvendando crimes e enfrentando criminosos, e de vez em quando entra em combate contra alguma entidade sobrenatural que deseje dominar a Terra.

Mandrake possui um parceiro, Lothar, Príncipe das Sete Nações Africanas. Mandrake e Lothar se conheceram durante uma viagem do mágico à África, e, após viverem uma aventura juntos, se tornaram melhores amigos, com Lothar decidindo regressar aos Estados Unidos com Mandrake para ajudá-lo a combater o crime. Lothar também possui superpoderes, tendo força suficiente para conseguir erguer um carro ou elefante com apenas uma das mãos, jamais se cansando durante qualquer atividade física, sendo imune aos efeitos do calor e do frio, e tendo pele impenetrável por qualquer arma criada por mãos humanas, desde facas a balas de metralhadora; além disso tudo, apesar de poder ser ferido por magia, ele não pode ser hipnotizado ou controlado por ela, e nunca recebe dano direto de ataques mágicos - como ser atingido por uma bola de fogo ou raio mágico. A origem de todos esses poderes jamais foi explicada. Lothar é considerado por muitos historiadores como o primeiro super-herói negro dos quadrinhos, e é um dos primeiros combatentes do crime negros da ficção. Ele estrearia já na primeira tira de Mandrake, mas, durante muito tempo, foi retratado como uma espécie de escravo do mágico, ajudando-o porque ele era seu mestre, e falando inglês com erros ortográficos e gramaticais; somente em 1964, quando Fredericks assumiu os roteiros, ele decidiu mudar a história para que os dois fossem melhores amigos, para que Lothar ajudasse Mandrake voluntariamente, e passou a escrever seus diálogos com inglês correto, inclusive dando a entender que, além de poderoso, Lothar também era muito inteligente.

Outros aliados de Mandrake são a Princesa Narda, interesse amoroso do mágico, da fictícia nação europeia de Cockaigne, governada por seu irmão, Segrid; Hojo, o chef de Xanadu, na verdade um agente secreto mestre das artes marciais, que fala seis idiomas e usa a ajuda de Mandrake para solucionar casos bizarros; Bradley, o Chefe de Polícia, que recorre a Mandrake sempre que se depara com algum caso inexplicável; Lenore, meio-irmã de Mandrake por parte de mãe, arqueóloga e exploradora; e Karma, modelo africana e noiva de Lothar, introduzida na década de 1960 por Fredericks. Fredericks também passaria a usar como personagem coadjuvante o pai de Mandrake, Theron, fazendo dele diretor de uma escola de magia no Himalaia, e revelando que ele tem centenas de anos.

O arqui-inimigo de Mandrake é o Cobra, que na verdade é Luciphor, seu meio-irmão por parte de pai, que é mais velho que Mandrake e se ressente por não ter sido escolhido como sucessor de Theron. Seu principal objetivo é encontrar os dois Cubos de Cristal, que elevarão seu poder mágico latente ao infinito e o transformarão no mágico mais poderoso da Terra. Além de Luciphor e Lenore, Mandrake tem um irmão gêmeo, Derek, que possui poderes muito inferiores aos dele, os utiliza na maior parte das vezes para ganhar dinheiro, e em algumas histórias é o vilão, normalmente cometendo pequenos crimes. Outros vilões recorrentes são Saki, o Mestre dos Disfarces, capaz de assumir qualquer aparência, e que deixa um pequeno camelo de argila nos locais onde comete crimes; Aleena, mágica ex-colega de Mandrake, que usa seus poderes para cometer crimes, e sempre está tentando seduzir o mágico; Nitro Cain, criminoso que usa bastões explosivos como armas; e a organização criminosa 8, cujo símbolo é um polvo, que existe desde a época medieval e é liderada pelo misterioso Octon, cujo rosto só aparece em uma tela de computador.

A longo dos anos, além de nos jornais, Mandrake também teria histórias publicadas em várias revistas em quadrinhos, a maior parte delas republicações ou remakes das tiras. Em 1995, a Marvel tentaria lançar uma minissérie do personagem em três edições, com roteiro de Mike W. Barr e arte de Rob Ortaleza, mas as vendas seriam tão baixas que apenas duas edições seriam lançadas. O mágico também seria astro de uma novela de rádio, transmitida entre 11 de novembro de 1940 e 6 de fevereiro de 1942; de um seriado para o cinema em 12 episódios em preto e branco, produzido pela Columbia e lançado em 1939, com Warren Hull como Mandrake e Al Kikume como Lothar; e de dois filmes para a TV, lançados em 1954 e 1979. Desde a década de 1960, quando Federico Fellini, que era amigo de Falk, se mostrou interessado em dirigir, se fala na produção de um filme de Mandrake para o cinema; em 1980, após o lançamento do filme de Flash Gordon, a Embassy Pictures chegaria a contratar Michael Almereyda para escrever um roteiro, mas depois o engavetaria. Em 2007, a Baldwin Entertainment Group e a Hyde Park Entertainment comprariam os direitos de Mandrake para produzir um filme dirigido por Mimi Leder, com Jonathan Rhys Meyers no papel do mágico; em 2009 seria anunciado que Meyers seria substituído por Hayden Christensen, e que Lothar seria interpretado por Djimon Hounson, mas as filmagens jamais começariam. As últimas notícias sobre o filme são de 2016, segundo as quais Sacha Baron Cohen teria substituído Christensen.

O Fantasma é o mais recente dos três. Também criado por Falk, ele faria sua estreia numa tira em preto e branco, publicada de segunda a sábado, em 17 de fevereiro de 1936; em 28 de maio de 1939 estrearia a tira dominical, a cores e apresentando histórias independentes daquelas de segunda a sábado. A história do Fantasma começa em 1536, quando o pai do marinheiro inglês Christopher Walker é morto no litoral do fictício país africano de Bangala durante um ataque de piratas. Walker jura sobre o crânio do pai que combaterá o mal e protegerá o povo de Bangala pelo resto da eternidade, e, para isso, ele cria a Lenda do Fantasma: usando um uniforme que deixa apenas parte de seu rosto e suas mãos à mostra, e contando com seu conhecimento da selva, Walker inflige o medo no coração dos bandidos, que acreditam não estarem lutando contra um ser humano comum. Uma parte essencial da Lenda do Fantasma é que ele é imortal; para isso, todos os descendentes masculinos de Walker, ao atingir a idade apropriada, devem também assumir o manto do herói, para que aparente ser sempre o mesmo Fantasma desde o século XVI. As tiras de jornal acompanham as aventuras do vigésimo-primeiro Fantasma, também chamado Christopher Walker, mas de apelido Kit.

O Fantasma não possui superpoderes, contando apenas com sua força, agilidade, inteligência e com o mito de sua imortalidade; Walker treinou até atingir o ápice de sua forma física, e é considerado brilhante em várias áreas do conhecimento, mas ainda é um ser humano comum. Ele foi enviado por seu pai, também chamado Christopher (o vigésimo Fantasma), para estudar nos Estados Unidos, onde conheceu e se casou com Diana Palmer e teve dois filhos, a menina Heloise e o menino Kit (aparentemente, o nome verdadeiro do Fantasma também tem de ser sempre o mesmo), que já começou seu treinamento para se tornar o vigésimo-segundo Fantasma. Todos os Fantasmas, quando estão em Bangala, moram em uma moderna fortaleza construída dentro da sinistra Caverna da Caveira, e contam com a ajuda de dois companheiros animais, o cavalo Herói e o lobo Capeto - que, assim como o Fantasma, são substituídos de tempos em tempos, mas sempre por animais idênticos, para passar a impressão de que são imortais. O Fantasma conta com um anel com o símbolo da caveira, com o qual deixa sua marca em seus oponentes, conhecida como Marca do Bem. Os nativos de Bangala costumam chamar o herói de "O Espírito que Anda" e "O Homem que Não Pode Morrer", acreditando em sua imortalidade.

O Fantasma seria o primeiro super-herói a usar collant, algo que se tornaria uma marca registrada do gênero, e o primeiro a usar uma máscara do tipo domino, preta e que só cobre os olhos, que são retratados sem pupilas, algo que também se tornaria uma marca dos super-heróis - Falk declararia ter se inspirado nas esculturas gregas, cujos olhos sem pupilas deixavam com um aspecto sobrenatural que ele queria que o Fantasma transmitisse. Para os historiadores, ele é considerado um "herói de transição", no meio do caminho entre heróis pulp como o Sombra e Tarzan e os primeiros super-heróis a receberem esse nome, Superman e Batman. Vale citar como curiosidade que o uniforme do Fantasma é roxo, mas, em diversos países, como a tinta roxa era muito cara, ele seria pintado com outra cor - no Brasil, durante muitos anos, o Fantasma vestiria um uniforme vermelho.

A criação do Fantasma seria um produto direto do grande sucesso de Mandrake, que levaria a King a pedir que Falk criasse um novo herói. Ele inicialmente criaria uma história baseada na lenda do Rei Arthur, que seria rejeitada, tendo a ideia para o Fantasma, um herói que se faz passar por imortal, por acaso, enquanto voltava para casa. Inicialmente, o Fantasma seria um playboy milionário chamado Jimmy Wells, que vestiria o uniforme para combater o crime durante a noite; enquanto escrevia sua primeira história, que seria ambientada na selva por influência de Os Livros da Selva, uma das obras preferidas de Falk na infância, ele decidiria mudar toda a história, criando a Lenda do Fantasma e seus demais elementos. "O Fantasma" seria um nome provisório, e Falk não gostava muito dele, por já existirem vários outros personagens com "fantasma" no nome (incluindo O Fantasma da Ópera, de onde Falk teria tirado o nome, segundo boatos), mas, por não conseguir criar outro até o dia de entregar a história à King, deixaria esse mesmo.

Falk seria roteirista e desenhista do Fantasma por duas semanas, quando seria substituído na arte por Ray Moore, ficando só com os roteiros. Durante a Segunda Guerra Mundial, Moore, que serviu aquartelado, passaria a dividir os desenhos com seu assistente, Wilson McCoy, que assumiria definitivamente a arte em 1949. McCoy faleceria repentinamente de uma doença desconhecida em 1961, sendo substituído inicialmente por Carmen Infantino, que faria fama como desenhista da DC, então por Bill Lignante, e, antes do fim do ano, por Sy Barry. Barry seria responsável por uma modernização do Fantasma, dando várias ideias a Falk para deixar o personagem mais de acordo com a época na qual as histórias se passavam, dentre elas a de que Bangala deveria ser uma democracia, e que seu presidente pedia ajuda ao Fantasma para solucionar crimes ocorridos no país - até então, Bangala era uma espécie de estado tribal, algo já bem incomum na África da década de 1960, e as aventuras do Fantasma que não envolvessem elementos da selva, como contrabandistas e piratas, eram ambientadas em outros países, normalmente nos Estados Unidos.

Barry seria desenhista do Fantasma até se aposentar, em 1994, quando seria substituído por George Olsen na tira diária; Eric Doescher assumiria a tira dominical por um ano, sendo então substituído por Fred Fredericks. Em 1999, Falk faleceria, e a King entraria em contato com a editora dinamarquesa Egomont, que publicava na Escandinávia a revista Fantomen, que republicava as tiras do Fantasma junto a aventuras inéditas, escritas por Tony DePaul e Claes Reimerthi. No primeiro ano, DePaul ficaria responsável pela tira diária e Reimerthi pela dominical, mas, a partir de 2000, DePaul passaria a ser o único roteirista. Essa seria uma época muito conturbada para os fãs do Fantasma, que não gostavam dos roteiros de DePaul, principalmente porque ele reaproveitava muitas das histórias da Fantomen; as críticas aumentariam ainda mais quando, também em 2000, Graham Nolan passaria a ser o desenhista da tira dominical, e, em 2005, Paul Ryan passaria a ser o da diária, pois ambos também desenhavam as histórias de DePaul na Fantomen. A King, porém, pagaria pra ver, e não somente manteria o trio como também passaria a tira diária para Ryan em 2007, após a saída de Nolan. Em 2011, o uruguaio Eduardo Barreto assumiria a dominical, mas faleceria apenas alguns meses depois, com Ryan desenhando dois domingos antes de Terry Beatty assumir. Em 2016, Ryan também faleceria de repente, sendo substituído por Mike Manley, e, no ano seguinte, Beatty seria substituído por Jeff Weigel.

As tiras do Fantasma são publicadas até hoje, sendo que, desde 2016, as tiras diárias também são em cores; atualmente, os roteiros são de responsabilidade de DePaul, com Manley desenhando as tiras diárias e Weigel as dominicais. Ele é considerado o herói mais popular da King e parte do Top 3 da empresa, junto com Popeye e o Recruta Zero. No auge de sua popularidade, ele chegou a ser publicado em 583 jornais do mundo todo, com uma estimativa de 100 milhões de leitores; as tiras do Fantasma já foram publicadas em mais de 100 países, e em mais de 20 idiomas. Mas a história mais curiosa envolvendo o Fantasma num país estrangeiro ocorreu quando soldados norte-americanos aquartelados na Papua Nova Guiné durante a Segunda Guerra Mundial receberam caixas com revistas em quadrinhos para passar o tempo. O rosto do Fantasma se tornaria tão popular com o povo local que eles passariam a pintá-lo em escudos, junto a seus desenhos tribais característicos.

Assim como Flash Gordon e Mandrake, o Fantasma foi publicado em diversas revistas em quadrinhos, a maioria delas com republicações das tiras; dentre as inéditas, o destaque vai para uma minissérie publicada pela DC entre maio e agosto de 1988, com roteiro de Peter David e arte de Joe Orlando, que daria origem a uma série regular, com 13 edições publicadas entre março de 1989 e março de 1990, escrita por Mark Verheiden e desenhada por Luke McDonnell, que fez bastante sucesso e só foi cancelada porque a DC não conseguiu chegar a um acordo com a King para a renovação da licença. A Marvel também publicaria uma minissérie, em três edições entre fevereiro e abril de 1995, com roteiro de David de Vries e arte de Glenn Lumsden, mas ambientada no futuro e acompanhando o vigésimo-segundo Fantasma. A editora Moonstone também publicaria várias minisséries, edições especiais e séries regulares do Fantasma, com histórias diferentes daquelas das tiras de jornal, a partir de 2002. Mas a mais longa série em quadrinhos com histórias inéditas do Fantasma foi publicada na Austrália entre 1948 e 2008 pela editora Frew; todas essas histórias seriam feitas por artistas australianos, e jamais seriam republicadas em nenhum outro lugar do planeta.

No cinema, o Fantasma seria astro de um seriado em 15 episódios em preto e branco produzido pela Columbia em 1943, com Tom Tyler no papel do herói e Jeanne Bates como Diana Palmer; no enredo, dois cientistas de países rivais tentam encontrar a Cidade Perdida de Zoloz, um para explorá-la pelo conhecimento, o outro para usar seus recursos na Guerra, e, para isso, precisam de sete partes de um mapa, que estão escondidas em Bangala. Em 1996, seria lançado um filme para o cinema, com Billy Zane no papel do herói e Kristy Swanson como Diana; ambientado em 1938, o filme alterna entre Bangala e Nova Iorque, com o Fantasma tendo de impedir o empresário Xander Drax (Treat Williams) de reunir três crânios mágicos que lhe darão poderes ilimitados. Na TV, o personagem seria astro do desenho animado Fantasma 2040, que teve 35 episódios divididos em duas temporadas (a primeira com 20, a segunda com 15), exibidos entre 18 de setembro de 1994 e 3 de março de 1996, ambientado no futuro (em 2040, como diz o título) e acompanhando as aventuras do vigésimo-quarto Fantasma. A produção mais recente é uma minissérie em dois episódios do canal Syfy, exibidos em 22 e 23 de dezembro de 2009, também ambientada no futuro, com Ryan Carnes interpretando Kit Walker, o filho, já adulto e no papel de um vigésimo-segundo Fantasma futurista que não agradou muito aos fãs.

Defensores da Terra é ambientado no ano de 2015, no qual todos os recursos naturais do planeta Mongo se extinguiram, e Ming decide dominar a Terra para explorá-la. Flash Gordon, que há anos estava em Mongo lutando contra Ming, consegue chegar à Terra antes dele, e, para deter a invasão, recruta o Fantasma, Mandrake e Lothar. Flash e Mandrake são bem fiéis aos quadrinhos, mas o Fantasma e Lothar tiveram algumas alterações: o Fantasma, que também se chama Kit Walker, mas é o vigésimo-sétimo Fantasma, o que é matematicamente impossível de conciliar com as tiras de jornal, tem um anel capaz de disparar um raio laser, que deixa a Marca do Bem nos inimigos à distância, e, ao recitar a frase "pela Lei da Selva, o Espírito que Anda conclama a força de dez tigres" (o que também não faz sentido, já que não existem tigres na África) adquire força sobre-humana por alguns minutos; já Lothar, apesar de retratado como bastante forte, ágil, conhecedor de artes marciais, um gênio da estratégia e expert em mecânica, não possui nenhum dos superpoderes que tem nos quadrinhos, sendo um humano comum no ápice da forma física, como o Fantasma das tiras - além disso, no desenho, Lothar é caribenho, e não africano.

Além dos quatro heróis, a equipe de Defensores da Terra conta com quatro adolescentes: Rick Gordon é o filho de Flash, um gênio da computação tão corajoso quanto o pai, mas muito mais impulsivo; L.J. (sigla para Lothar Junior) é o filho de Lothar, prodígio das artes marciais; Jedda é a filha do Fantasma, que, sem maiores explicações, possui telepatia e poderes extrassensoriais; e Kshin é um órfão adotado por Mandrake para ser seu pupilo, que possui pequenos poderes de hipnotismo por estar ainda no início de seu treinamento. A base dos Defensores é equipada com o moderno computador Dynac X, que possui a mente da esposa de Flash e mãe de Rick, assassinada por Ming - o nome dela jamais é dito, mas fica subentendido que é Dale Arden. A equipe conta também com dois mascotes, a pantera negra Kisa, companheira inseparável de Jedda, com a qual ela consegue se comunicar usando telepatia, e o alienígena Zuffy, que se parece com um macaquinho, foi resgatado por Rick no planeta Mongo, e se tornou amigo de Kshin. O cavalo Herói e o lobo Capeto fazem participações especiais em alguns episódios, e um episódio que envolve viagem no tempo conta com a participação de outro personagem das tiras de jornal da King, o Príncipe Valente.

O principal antagonista é Ming, o Impiedoso, que montou uma base no ártico de onde coordena ataques que visam explorar os recursos naturais da Terra. Ele é acompanhado por seu filho, o Príncipe Kro-Tan, tão impiedoso quanto ele; sua filha, a mimada Princesa Castra; Mongor, uma serpente gigante que ele tem como animal de estimação; e Octon, uma inteligência artificial em um corpo robótico que se parece com um polvo, que serve como conselheiro e estrategista de Ming. Ming comanda um exército de robôs, destruídos às dezenas pelos heróis em cada episódio e comandados pelo General Garax. Outros vilões são os Piratas Espaciais; a Rainha Hadea, governante do Submundo, habitado por uma raça de humanoides pálidos e deformados, apaixonada pelo Fantasma e supostamente mãe de Jedda; Graviton, um ser extradimensional que procura por um artefato mágico que lhe dará poder para governar a Terra; e Kurt Walker, o irmão mais velho de Kit, criado especialmente para o desenho, que foi deserdado por seu pai após trapacear na prova para se tornar Fantasma, e agora quer destruir Kit para se vingar.

Defensores da Terra seria exibido, já em regime de syndication (em vários canais simultaneamente), entre 8 de setembro e 5 de dezembro de 1986, para um total de 65 episódios. Surpreendentemente, o desenho foi criado pela Marvel, que procurou a King com a proposta de olho em uma série em quadrinhos e uma linha de brinquedos associadas. A série em quadrinhos realmente seria lançada, mas um mês após o fim da primeira temporada da série animada, em janeiro de 1987; a primeira edição teria roteiro de Stan Lee, e a série foi pensada para ser regular, mas, após outras três edições (escritas por Michael Higgins; todas as quatro tiveram arte de Alex Saviuk), ela seria cancelada por baixas vendas, mesmo com uma história em aberto e um aviso de que a história continuava na próxima edição. O insucesso da revista seria usado como argumento pela King para não renovar o contrato para uma segunda temporada do desenho, embora a primeira tenha tido boa audiência. A linha de brinquedos também seria lançada em 1987, pela Galoob, e contaria com apenas seis bonecos: Flash Gordon, Mandrake, Lothar, o Fantasma, Ming e Garax. Em 1990, seria lançado Defenders of the Earth, um game para os computadores Amiga, Atari ST, Commodore 64, Amstrad CPC, SAM Coupe e ZX Spectrum, no qual o jogador controlava Flash Gordon tendo de invadir a fortaleza de Ming para impedir o vilão, enfrentando Garax, Octon e Mongor pelo caminho e contando com a ajuda de Mandrake, Lothar e do Fantasma em algumas fases.

Para terminar, vale dizer que a letra da música de abertura do desenho foi escrita por ninguém mais, ninguém menos, que Stan Lee. Curiosamente, e não sei por qual motivo, na versão brasileira, exibida pelo SBT, a abertura não era cantada, contando apenas com um tema instrumental.
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domingo, 23 de janeiro de 2022

Escrito por em 23.1.22 com 0 comentários

Galaxy Rangers / BraveStarr

Hoje eu vou fazer um post com dez anos de atraso. Como eu contei aqui recentemente, no post sobre os GoBots, entre 2011 e 2012 eu fiz uma série não-oficial sobre desenhos dos anos 1980, sempre dois a dois. A série era não-oficial porque não foi planejada; sempre que eu me lembrava de mais dois desenhos, escrevia um post sobre eles - até por isso, ela acabou sem muito alarde, inclusive sem que eu tivesse falado sobre todos dos quais eu gostava.

Por várias vezes enquanto escrevia os posts dessa série, porém, eu pensei em escrever um falando sobre BraveStarr e Galaxy Rangers - juntar os dois em um mesmo post parecia óbvio, porque ambos são faroeste no espaço. Nunca concretizei esse plano porque, ao contrário de todos os meus amigos, que, além de amarem o desenho ainda queriam ser o Goose, eu não gostava de Galaxy Rangers. Não sei bem explicar o motivo; embora eu o assistisse, não conseguia ver o que meus amigos achavam de tão legal nele, e nunca tive por ele o mesmo entusiasmo que tinha, por exemplo, com BraveStarr, do qual eu aguardava ansiosamente o capítulo seguinte. Pesquisando para escrever esse post, descobri que, na época, Galaxy Rangers foi considerado um desenho à frente de seu tempo, e esse pode ser um motivo - acostumado com a fórmula dos demais, meu cérebro o rejeitou.

Seja como for, embora hoje eu não possa dizer que goste de Galaxy Rangers, já que, desde aquela época, nunca mais o assisti novamente, depois de fazer o post sobre GoBots e Dino-Riders me lembrei dessa história, e decidi que finalmente tiraria do papel a ideia de um post duplo sobre BraveStarr e Galaxy Rangers. Que, obviamente, é esse que vocês estão lendo agora.

Vamos começar pelos Galaxy Rangers, ou melhor, The Adventures of the Galaxy Rangers, que era o nome oficial do desenho, criado por Robert Mandell e produzido por uma empresa chamada Gaylord Productions. A família Gaylord, dona do jornal The Oklahoman desde 1903, começaria seu império das comunicações em 1928, quando seria inaugurada a rádio WKY, em Oklahoma City, Estados Unidos. Em 1949, o patriarca da família, Edward King Gaylord, decidiria se arriscar pelo então novíssimo ramo da televisão, e inauguraria um canal regional no estado de Oklahoma, chamado WKY-TV. O negócio prosperaria, e, na década de 1960, o grupo, oficialmente chamado Oklahoma Publishing Company, já seria dono de dez rádios e sete canais de TV no Oklahoma, Novo México e Texas. King Gaylord faleceria em 1974, aos 101 anos de idade, e passaria o controle do conglomerado a seu filho, Edward Leroy Gaylord, que decidiria expandir os negócios para a Costa Oeste, comprando um canal de TV em Seattle, e dividiria os departamentos de rádio e TV, chamando a nova empresa de TV de Gaylord Broadcasting Company. Em 1979, após comprar mais um canal de TV, esse em Los Angeles, Leroy Gaylord decidiria fundar a Gaylord Productions, visando a produção de conteúdo próprio para a TV - e foi essa empresa que empregou Mandell, que, dentre outras coisas, criou os Galaxy Rangers em 1984.

Por causa disso, diferentemente da maioria dos desenhos dos anos 1980, os Galaxy Rangers não eram baseados em uma linha de brinquedos - embora uma tenha sido criada para lançamento simultâneo ao desenho, para render mais dinheiro à Gaylord. Outra característica marcante do desenho foi que sua animação não foi feita nos Estados Unidos, e sim no Japão, pelo estúdio Tokyo Movie Shinsha, o que fez com que The Adventures of the Galaxy Rangers fosse um dos primeiros desenhos norte-americanos com estética de anime. Combinando temas da ficção científica e do faroeste, o desenho foi considerado revolucionário para a época, principalmente por tocar em temas adultos como depressão, luto, vingança e senso de pertencimento - inclusive, dois dos personagens, Goose e Niko, tinham uma tensão romântica quase sexual, comparável à de casais encontrados em séries de TV, algo impensável num desenho infantil até hoje em dia, quanto mais nos anos 1980.

A história do desenho começa em 2086, quando dois alienígenas vêm à Terra para buscar aliados contra a expansão do Império Crown. Em troca da ajuda da Terra, eles compartilham planos que possibilitam a construção da primeira nave espacial terrestre, o que, por sua vez, dá início à colonização espacial. Um número não revelado de anos se passa, e, na época em que o desenho é ambientado, a humanidade já se espalhou pelo universo, possuindo colônias em planetas de toda a galáxia; após travar contato com vários povos alienígenas, a tecnologia da Terra também avançou consideravelmente. Infelizmente, junto com o avanço tecnológico e o da colonização, veio também o aumento da criminalidade, seja causado por humanos que querem levar uma vida fácil nas colônias, seja por alienígenas que veem os terráqueos como ameaça, incluindo o Império Crown. Para combater essa criminalidade espacial, foi criada a agência BETA (da sigla em inglês para Escritório de Assuntos Extra-Terrestres), sediada na Terra, que treina agentes conhecidos como Rangers para manter a ordem nas colônias - cuja maioria é baseada em agricultura ou mineração, e tem nomes que lembram o Velho Oeste norte-americano, como Nebraska, Mesa, Ozark e Pradaria. Um grupo especial de Rangers recebe da BETA um aprimoramento tecnológico especial, chamado Série 5, ou S-5, implantado diretamente em seus cérebros - a coisa mais próxima existente da criação de um ciborgue. Combinando seu treinamento com suas habilidades naturais e o poder do S-5, eles se tornam os Galaxy Rangers, a força de elite da BETA, dedicados principalmente a derrotar o Império Crown de uma vez por todas.

O líder dos Galaxy Rangers é o Capitão Zachary Foxx, nascido na Terra (ninguém diz, mas, provavelmente, nos Estados Unidos). Antes do início da série, durante uma luta contra um pirata espacial chamado Capitão Kid, Foxx ficou seriamente ferido, e teve seu braço e perna esquerdos substituídos por membros biônicos. No primeiro episódio, a esposa de Foxx é aparentemente morta durante um ataque do Império Crown, o que o impele a se voluntariar para o projeto S-5 e sugerir a criação dos Galaxy Rangers. Graças a seus membros cibernéticos, Foxx tem força sobre-humana; ativando o S-5 (o que é feito através de um toque na estrela de xerife que os Galaxy Rangers levam no peito), ele cria um boost de energia que amplia ainda mais essa força, permitindo-o também, disparar rajadas de energia de seu braço esquerdo, capazes de abrir um buraco em uma parede. Foxx é pai de dois filhos, rígido com eles e com seus subordinados, mas amoroso; ele está, entretanto, em busca de vingança, e é capaz de tudo para destruir o Império Crown.

O personagem mais popular da série era Shane Gooseman, apelido Goose, cuja aparência foi baseada na do ator Clint Eastwood. Goose era originalmente uma espécie de supersoldado, tendo nascido em um tubo de aminoácidos sem jamais conhecer seus pais; ele era, porém, "defeituoso", pois era o único do programa capaz de sentir compaixão - e isso fez com que ele se salvasse, pois, durante uma etapa crucial do projeto, ele estava afastado da equipe por indisciplina, treinando sua pontaria. Nessa etapa, todos os supersoldados foram expostos a um gás que aceleraria sua maturação e ampliaria seus poderes, mas teve como efeito colateral deixá-los extremamente agressivos e mentalmente instáveis, sofrendo, por exemplo, de paranoia. Para não representarem uma ameaça, esses supersoldados seriam presos em câmaras criogênicas, mas alguns conseguiriam escapar, sendo rotulados como Renegados. Goose receberia permissão do governo para se unir aos Galaxy Rangers com a condição de que o grupo se comprometesse a caçar e capturar ou eliminar os Renegados - caso se recuse a cumprir essa missão, ele também, mesmo sem ter sido afetado pelo gás, será aprisionado na câmara criogênica. Como todos os supersoldados, Goose tem a capacidade de alterar seu corpo a nível molecular, se tornando capaz de resistir a temperaturas extremas, absorver rajadas de energia e se curar de vários tipos de ferimentos; esse processo normalmente leva horas, mas, ativando o S-5, ele consegue se modificar instantaneamente - embora usar o implante várias vezes seguidas o deixe esgotado fisicamente. O gás fez nos Renegados o mesmo efeito que o S-5 faz em Goose, o que significa que eles sempre podem se adaptar instantaneamente, e com que Goose seja o único capaz de enfrentá-los em um combate corpo a corpo. Goose é reservado, desconfiado, irresponsavelmente corajoso, e tem dificuldade em se sentir parte do grupo.

A única mulher do grupo é Niko (que também é a única que não tem sobrenome), nascida na colônia de Alspeth, que foi destruída durante um ataque alienígena. Niko é uma arqueóloga, e possui poderes psíquicos, que pôde desenvolver por ter sido criada na colônia alienígena de Xanadu, para onde foi levada após sobreviver ao ataque à sua colônia natal. Ela também é uma mestra em artes marciais, e a única do grupo que prefere usar uma escopeta ao invés de duas pistolas. Ativando o S-5, ela amplia suas habilidades psíquicas ao máximo, se tornando capaz de "enxergar" a anos-luz de distância, ter vislumbres do passado ou do futuro, mover objetos com o poder da mente (o que ela já consegue fazer normalmente, mas de forma limitada) ou criar um escudo que protege a ela ou a seus companheiros de qualquer tipo de dano, mas a deixa extremamente cansada com pouco tempo de uso. Niko é determinada, valente, mas assombrada por seu passado; ela seria escolhida para os Galaxy Rangers devido ao seu conhecimento de culturas alienígenas.

Completa o grupo Walter Hartford, apelido Doc, um gênio da computação nascido na Jamaica que parece saído de um filme de Erroll Flynn, lutando simultaneamente com uma espada, pistolas e seus punhos. Doc foi responsável pela criação de quase todos os sistemas eletrônicos da BETA, incluindo os equipamentos dos Galaxy Rangers, e teve participação fundamental no projeto S-5. Ele carrega sempre consigo um computador pessoal capaz de se manifestar na forma de um sólido geométrico feito de energia; seu S-5 permite que ele use esse computador para criar programas especiais que possibilitam que ele invada e controle qualquer computador. Membro de uma família rica e tendo estudado nas melhores escolas, Doc destoa de seus colegas de equipe por ser bem-humorado, brincalhão, e estar sempre em busca de novos desafios - ele se voluntariou para os Galaxy Rangers, inclusive, por achar que suas habilidades não estavam sendo desafiadas o suficiente com ele trancado em um laboratório criando equipamentos eletrônicos.

Ao longo da série, os Galaxy Rangers enfrentam três tipos de vilões: bandidos comuns, ao estilo dos encontrados em histórias do Velho Oeste ou de ficção científica, os Renegados, ou os membros do Império Crown, que consideram a Terra uma ameaça e querem destruir todas as colônias. O Império Crown é controlado pela Rainha Crown, que tem o sonho de dominar toda a galáxia; ela usa como soldados seres vindos de vários mundos já controlados por ela, e seus principais generais são os Senhores de Escravos, uma raça com a qual ela tem uma ligação mental e que se alimentam da energia vital de outros seres - e que descobriram que os humanos são os que provêm a maior quantidade de energia, dentre todos os povos que eles já experimentaram. Vale citar também que, para se manter no tema Velho Oeste, cada Galaxy Ranger possui um cavalo - mas, como se trata de uma série de ficção científica, é um cavalo-robô, algo que eu achava meio ridículo quando eu era criança.

Apesar de ter sido um sucesso de crítica, o desenho não teve audiência muito boa, e acabou tendo apenas uma temporada, de 65 episódios, exibidos já em regime de syndication (em vários canais ao mesmo tempo), entre 14 de setembro e 11 de dezembro de 1986. Os direitos sobre os Galaxy Rangers desde 2008 pertencem à Hasbro, que produziu a linha de brinquedos que acompanhou a série.

Ah, e se interessa a alguém o futuro da Gaylord: após se tornar uma das maiores empresas dos Estados Unidos, dona de canais de TV em todos os estados da porção sul do país, e de comprar gravadoras de música country, canais a cabo nos Estados Unidos e Europa, canais a cabo e gravadoras de música gospel, um parque temático e 20% do time de hóquei no gelo Nashville Predators - que, entre 1997 e 2007, teve sua arena renomeada para Gaylord Entertainment Center - a Gaylord decidiria entrar para o ramo imobiliário, primeiro como parceira na construção de um condomínio de luxo em Nashville, Tennessee, depois com a construção ou compra de vários hotéis. Em 2008, a rede hoteleira da Gaylord Hotels já dava mais lucro para a empresa do que todos os seus outros empreendimentos, que começaram a ser vendidos aos poucos, com a maioria dos canais e produções de TV passando para a CBS. Em 2011, Leroy Gaylord, aos 80 anos de idade, decidiria vender o que restava da empresa para a Ryman Hospitality Properties. Hoje, a Ryman, que tem sua área de atuação principal no ramo de compra e venda de imóveis, ainda é dona de 11 hotéis, uma rádio (a WSM, de Nashville), uma rede de TV por assinatura (a Circle, dedicada ao universo country) e um auditório em Nashville que eram de propriedade da Gaylord; o jornal The Oklahoman, porém, foi vendido em 2018.


Vamos passar agora para BraveStarr, que, assim como Galaxy Rangers, é ambientado no futuro, numa época em que a humanidade começou a colonizar outros planetas e, por alguma razão, eles se parecem com o Velho Oeste norte-americano. BraveStarr é o xerife da colônia de Novo Texas, dedicada à mineração de kerium, um mineral avermelhado que é usado como combustível. Localizado a 1957 anos-luz da Terra, e orbitando nada menos que três sóis, Novo Texas é completamente deserto e extremamente inóspito, ao ponto de a própria água ser uma raridade, tendo de ser trazida de outros planetas ou obtida de dentro de uma espécie de cacto nativo, pois as únicas áreas com água no planeta são habitadas por felinos gigantes hostis que atacam ao menor sinal de invasão - o lucro obtido pela mineração do kerium, entretanto, compensa as adversidades. Além dos humanos que foram até Novo Texas em busca de uma vida melhor, e dos alienígenas que decidem se aventurar por lá, o planeta tem uma raça inteligente nativa, o Povo do Deserto, que, em sua maioria, trabalha nas minas de kerium.

Os problemas de Novo Texas começam quando Stampede, um alienígena que se parece com um dragão e controla uma espécie de máfia, se interessa pelo dinheiro obtido pela exploração do kerium, e ordena a seus asseclas que façam atos típicos do Velho Oeste, como assaltar as diligências que levam a produção, atormentar a população local oferecendo proteção e criar confusão em geral para dificultar a venda do mineral. A gangue comandada por Stampede conta, dentre outros, com Scuzz, um membro do Povo do Deserto que decidiu ser fora da lei e está sempre fumando um charuto; Cabeça de Cacto, um robô que pode se disfarçar de cacto e serve como espião e como alívio cômico; Terremoto, um robô capaz de disparar rajadas de energia pelo braço; Touro Bravo, uma criatura reptiliana com o poder de criar tempestades de areia; e Víbora, uma mulher meio-réptil com poderes hipnóticos. Outros vilões recorrentes, sem ligação com Stampede, são os Coiotes, que se parecem, bem, com coiotes antropomórficos, e estão sempre praticando pequenos crimes e se envolvendo em confusão. Alguns episódios também contam com vilões de um episódio só, como o porco Hawgtie e o ciborgue Duas-Caras.

Para lidar com todas essas ameaças, BraveStarr, que é um indígena norte-americano, conta com quatro poderes mágicos ligados a totens animais: os Olhos do Falcão permitem que ele enxergue a longas distâncias, os Ouvidos do Lobo ampliam sua audição, a Força do Urso aumenta sua força para a de dez homens, e a Velocidade do Puma permite que ele corra tão rápido quanto uma locomotiva. Cada um desses quatro poderes só pode ser usado um por vez, e cada um possui um curto tempo de duração. Além de seus poderes, BraveStarr conta com equipamentos tecnológicos, como uma pistola neural, que atordoa os atingidos ao invés de matá-los (porque, afinal, desenho infantil), uma machadinha laser, um laço energético, um visor computadorizado que serve como binóculo, e um escudo de curta duração ativado por sua estrela de xerife. Mesmo sendo o xerife, BraveStarr é um pacifista, e sempre tenta resolver qualquer conflito com conversa e diplomacia, somente recorrendo a suas armas e seus poderes em último caso.

BraveStarr também possui muitos aliados, o principal deles seu parceiro Furacão (Thirty/Thirty no original, que se traduz como Trinta/Trinta), um alienígena da raça ds equestroides. Furacão se parece com um cavalo-robô, mas é um ser vivo, capaz de assumir, à vontade, duas formas, a quadrúpede, quando atua como montaria de BraveStarr, e a bípede, quando atua como seu principal delegado. Ele é extremamente inteligente e dado a comentários sarcásticos, mas também bastante impaciente, tem pavio curto, e, ao contrário de BraveStarr, prefere resolver todos os seus problemas com chumbo. Ele possui uma arma personalizada que, em português, chama de Trabuco ou Trabuquinho, mas que, no original em inglês, se chama Sarah Jane, uma escopeta que dispara rajadas de energia.

Outros aliados de BraveStarr são o Delegado Fuça, do Povo do Deserto, que, tirando Furacão, é o mais leal e competente subordinado do xerife, embora seja meio atrapalhado; a Juíza McBride, que atua como juíza, advogada, consultora legal e interesse romântico de BraveStarr; e Xamã, o mentor de BraveStarr, que possui poderes místicos como teletransporte, viagem no tempo, telecinese e clarividência. Foi Xamã quem ensinou BraveStarr a usar seus poderes, e é a ele que o xerife recorre, presencialmente ou através de telepatia, quando se depara com uma situação difícil. Alguns personagens recorrentes dignos de nota são Angus McBride, pai da Juíza e editor do jornal local; Doc Clayton, o médico da cidade; Montanha, dono e barman do saloon local; Molly, responsável pelas diligências que entram e saem da cidade; e o Prefeito Derringer.

Mas falta falar de um dos principais personagens da série, o vilão Tex Hex. Membro da gangue de Stampede, embora prefira agir sozinho, Tex Hex é o rival, oponente e antítese de BraveStarr. Originalmente, foi ele quem descobriu a mina de kerium em Novo Texas, e, durante muitos anos, foi um mineiro legalizado, parceiro de Angus McBride; um dia, a nave na qual ele iria transportar kerium para fora do planeta explodiu, e ele ganhou poderes semelhantes aos de BraveStarr. Acreditando que o xerife foi responsável pelo seu infortúnio, ele se aliou a Stampede, que o salvou dos destroços, e jurou que iria destruir BraveStarr nem que fosse a última coisa que fizesse.

A própria origem do desenho de BraveStarr tem a ver com Tex Hex: ele seria criado em 1986, para ser um dos vilões de um desenho da Filmation, mesma produtora de BraveStarr, chamado Os Fantasmas (cujo nome em inglês, assim como o dos Caça-Fantasmas, é Ghostbusters). O produtor Lou Scheimer adoraria o conceito, a aparência e os poderes do personagem, e consideraria ser um desperdício utilizá-lo como vilão secundário em uma série já em produção; ele incumbiria, então, o vice-presidente Arthur Nadel e o diretor de arte John Grusd de criar um desenho ambientado no Velho Oeste, do qual Tex Hex seria o vilão principal. A criação do desenho em si, incluindo sua ambientação e seus personagens, ficaria a cargo do roteirista Bob Forward.

BraveStarr foi um grande sucesso de crítica, e sua audiência também não foi ruim; infelizmente, na época de sua exibição, a Filmation estava passando por graves problemas financeiros, que fizeram com que ele só tivesse uma temporada, de 65 episódios, exibidos em syndication entre 14 de setembro de 1987 e 24 de fevereiro de 1988. BraveStarr seria o último desenho animado produzido pela Filmation antes de a produtora abrir falência, em 1989; além de sua segunda temporada ter sido cancelada, estava em pré-produção um spin-off, chamado Bravo!, que seria estrelado pelo Povo do Deserto, mais ou menos no estilo de desenhos como Ewoks e Snorks, e que acabaria jamais saindo do papel.

Quando a segunda temporada foi cancelada, Forward e o também roteirista Steve Hayes estavam trabalhando em um episódio em múltiplas partes, que serviria para iniciar a segunda temporada, mas traria explicações sobre o passado de BraveStarr e de Novo Texas. Forward e Hayes conseguiriam autorização da Filmation para levar seu roteiro a outra produtora, transformando-o num filme para cinema, chamado A Lenda de BraveStarr (BraveStarr: The Legend, também conhecido como BraveStarr: The Movie), produzido pela Taurus Entertainment, que estrearia em 18 de março de 1988. O filme conta como o kerium foi descoberto, como BraveStarr se tornou xerife de Novo Texas, e explora suas relações pessoais com Tex Hex, Furacão e a Juíza - é até revelado que Stampede e Xamã são rivais, e que o mentor de BraveStarr uma vez tentou destruir o criminoso, sem sucesso. O filme foi muito bem recebido pela crítica, mas, exibido pelos cinemas apenas em matinês e aos fins de semana, não teve boa bilheteria.

Assim como Galaxy Rangers, BraveStarr ganharia uma linha de brinquedos produzida após a criação do desenho, mas essa lançada um ano antes de sua estreia na TV, em 1986, o que faz com que muita gente ache que o desenho foi criado para ajudar a vender os brinquedos (o que, como vimos em outros posts sobre desenhos dos anos 1980, era o normal). A linha de BraveStarr era produzida pela Mattel, e tinha bonecos muito maiores que o normal para a época, com 20 cm de altura. Uma segunda linha chegou a ser planejada para lançamento em 1987, mas, por motivos jamais revelados, foi descartada. BraveStarr também seria o astro de uma série em quadrinhos, que teve seis edições publicadas pela editora Blackthorne, também antes da estreia do desenho, entre janeiro e junho de 1987, e de um game, lançado para os computadores Commodore 64, Amstrad CPC e ZX Spectrum em 1988.

Para terminar, vale dizer que, assim como em outros desenhos da Filmation - o mais lembrado por isso sendo o do He-Man - no final de cada episódio de BraveStarr havia um curto segmento no qual BraveStarr ou algum outro personagem do desenho falava sobre algo ocorrido naquele episódio e alertava as crianças sobre algum perigo ou dava alguma dica valiosa para o resto de suas vidas - em muitos episódios, esse segmento terminava com Scuzz dizendo que fumar era errado. Um desses segmentos rendeu um prêmio do governo dos Estados Unidos à Filmation, em um episódio no qual, devido a um Coiote traficante, um adolescente se vicia em uma droga chamada Spin, e acaba morrendo de overdose; a fala de BraveStarr contra o uso de drogas seria considerada didática, relevante e necessária, o que justificaria o prêmio.
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domingo, 21 de novembro de 2021

Escrito por em 21.11.21 com 0 comentários

GoBots / Dino-Riders

Do começo de 2011 ao final de 2012, eu fiz aqui uma série não-oficial sobre desenhos dos anos 1980, sempre dois a dois. Hoje, quase uma década após seu encerramento, essa série vai ganhar uma nova entrada, porque, recentemente, dois eventos em separado fizeram com que eu me lembrasse de dois desenhos que eu não abordei nela, mas dos quais eu gostava.

Vamos começar pelo desenho dos GoBots. Assim como os Transformers, os GoBots eram robôs alienígenas conscientes que se transformavam em veículos da Terra, divididos em duas facções, uma representando o bem e a outra o mal, que guerreavam entre si e trouxeram sua luta para nosso planeta, com os bons fazendo amizade com um menino humano ao chegar aqui. Eu gostava do desenho dos GoBots, mas achava ele meio tosco, principalmente porque, no caso dos Transformers, nem sempre era fácil perceber quais os passos que levavam à transformação do robô em veículo - olhando para, por exemplo, Wheeljack, você não percebe de primeira onde cada parte vai ter que se encaixar para ele virar um carro - mas, no caso dos GoBots, não somente era absurdamente óbvio qual parte de cada robô se transformava em qual parte de cada veículo - com alguns robôs, como Turbo, sendo pouco mais que veículos com cabeça, braços e pernas, e alguns veículos sendo claramente um robô todo dobrado, como o helicóptero no qual Cop-Tur se transforma - mas também, enquanto a transformação dos Transformers era em velocidade relâmpago, a dos GoBots era praticamente em câmera lenta, mostrando um passo a passo de como os robôs se transformavam. A explicação para isso era que, assim como os Transformers, os GoBots foram baseados em uma linha de brinquedos, e, enquanto os criadores do desenho dos Transformers decidiram tomar certas liberdades criativas - o Bumblebee do desenho era bem diferente do boneco do Bumblebee lançado aqui pela Estrela, algo com o qual eu nunca me conformei - os criadores do desenhos dos GoBots decidiriam fazer os personagens o mais idênticos possível aos brinquedos. Por causa disso, talvez contraditoriamente, eu gostava muito mais dos brinquedos dos GoBots - alguns lançados aqui no Brasil com o nome de Mutantes pela Glasslite, outros em uma série sem nome pela Mimo - do que dos brinquedos dos Transformers - dos quais apenas alguns foram lançados aqui pela Estrela; Optimus Prime e Megatron, por exemplo, nunca foram.

Diante da explicação do parágrafo anterior, a conclusão lógica é a de que os GoBots eram uma cópia dos Transformers, lançados para pegar carona no sucesso do desenho e possibilitar que algum concorrente vendesse brinquedos com o mesmo tema. De fato, eu e todos os meus amigos achávamos o mesmo. Acontece que, na realidade, essa história tem um plot twist, já que os GoBots foram lançados antes dos Transformers. Ainda assim, não dá para dizer que os Transformers seriam cópias dos GoBots, porque, assim como ocorreu, por exemplo, com o Monstro do Pântano e o Homem-Coisa, como os X-Men e a Patrulha do Destino, o lançamento de ambas as séries foi tão próximo uma da outra que era impossível que um dos concorrentes tivesse tomado conhecimento do outro e decidido copiá-lo, com o consenso geral sendo de que as similaridades entre as duas séries são apenas bizarras coincidências.

Os brinquedos que dariam origem aos Transformers, conhecidos no Japão como Diakron e Kronoform, seriam lançados na Terra do Sol Nascente antes, em 1980, mas somente em 1983 eles começariam a se transformar (sem trocadilho) nos Transformers, quando sua fabricante, a Takara, decidiria firmar um contrato com a Hasbro para sua produção e distribuição nos Estados Unidos; adotando uma técnica inaugurada por He-Man e os Mestres do Universo, a Hasbro encomendaria uma série em quadrinhos e um desenho animado para serem lançados simultaneamente aos brinquedos (ambos produzidos pela Marvel, o desenho em parceria com a Sunbow), e só aí aqueles brinquedos que não tinham nenhuma história de fundo, sendo apenas robôs e pronto, se transformariam nos Autobots e Decepticons, com todas as três produções (quadrinhos, desenho e brinquedos) sendo lançados em 1984.

Os brinquedos que dariam origem aos GoBots, chamados Machine Robo, seriam lançados no Japão pela Bandai em 1982, mas chegariam ao mercado norte-americano já no ano seguinte, lançados pela Tonka - ou seja, um ano antes dos brinquedos dos Transformers. Os Machine Robo não tinham nomes próprios nem personalidade, se chamando, por exemplo "robô avião" ou "robô motocicleta"; além disso, eles não eram robôs "vivos", e sim mecha, devendo ser pilotados por seres humanos mesmo após se transformarem em robôs. Ao lançar os brinquedos nos Estados Unidos, com o nome de GoBots, a Tonka decidiria dar nomes aos robôs, e, mesmo assim, não eram nomes lá muito criativos, com o robô que virava tanque se chamando Tank e o que virava um bugre se chamando Buggyman, por exemplo; em pequenas fichas que vinham no verso da cartela, a Tonka também deixaria claro que os robôs tinham personalidade e inteligência próprias, embora, inicialmente, ainda não tivesse determinado que eles eram alienígenas, nem os separado em heróis e vilões.

Diferentemente do que fez a Hasbro, somente após lançar os brinquedos a Tonka teria a ideia de encomendar um desenho animado, produzido pela Hanna-Barbera, que seria a responsável por separar os robôs em duas facções, os heroicos Guardiões e os malignos Renegados, e determinar que eles eram alienígenas - vindos do planeta Gobotron, ora vejam só. Challenge of the GoBots, o desenho criado pela Hanna-Barbera, estrearia já em regime de syndication (em vários canais dos Estados Unidos ao mesmo tempo) em 8 de setembro de 1984, uma semana antes do desenho dos Transformers, que estrearia em 17 de setembro do mesmo ano.

Uma diferença entre os GoBots e os Transformers era que, originalmente, os GoBots eram humanos. Há milhares de anos, o planeta Gobotron era habitado pelos GoBeings, que já estavam envolvidos em uma guerra civil causada pelos Renegados. Um dia, um dos planos dos Renegados deu errado, e um asteroide se chocou contra Gobotron, destruindo metade do planeta e causando vários desastres naturais. Para que os GoBeings não fossem extintos, o cientista Ex-El criou um método pelo qual suas mentes seriam transferidas para corpos mecânicos, criando os GoBots. Anos depois, graças a um aparelho chamado Modificador, os GoBots também ganhariam a habilidade de se transformar em veículos. A guerra civil continuou, agora entre duas facções de robôs, até que um pequeno grupo de Guardiões, liderado por Leader-1, decidiu se lançar ao espaço em busca de ajuda. Atacados por um grupo de Renegados liderado por Cy-Kill, eles cairiam na Terra, com a batalha entre as facções continuando por aqui - porque Leader-1 é o líder de todos os Guardiões, e, para os Renegados, destruí-lo aqui significa ganhar a guerra em Gobotron.

Inicialmente, cada facção contava com apenas três robôs, que eram os que estavam nas naves que caíram na Terra: os Guardiões eram Leader-1, que se transforma em um avião a jato, Turbo, que se transforma em um carro esporte, e Scooter, que se transforma em uma scooter; os Renegados eram Cy-Kill, que se transforma em uma moto, Cop-Tur, que se transforma em um helicóptero, e Crasher, que se transforma em um carro de corrida. Scooter é um adolescente, e faz amizade com um menino humano, chamado Nick Burns, enquanto Crasher é uma "robô feminina"; ambos os fatos são explicados pela história de que os GoBots originalmente eram humanos - e nisso os GoBots foram mais inclusivos, já que o primeiro Transformer feminino, Elita-One, só apareceria na segunda temporada, em novembro de 1985. Conforme a série avançava, novos GoBots chegariam à Terra, tanto Guardiões quanto Renegados; eles atuavam como "convidados especiais", porém, com a maioria aparecendo em apenas um episódio cada, e apenas o sexteto já citado sendo os protagonistas do desenho. Também é importante dizer que, diferentemente dos Transformers, os GoBots não tinham armas, mas eram capazes de disparar raios por seus punhos; e os Guardiões e Renegados, ao contrário dos Autobots e Decepticons, não tinham símbolos que os identificassem, embora os Renegados tivessem aparência mais ameaçadora.

Assim como outros desenhos dos anos 80, Challenge of the GoBots estrearia como uma minissérie de cinco episódios, para testar a audiência; como ela foi boa, uma "segunda temporada", de mais 60 episódios, estrearia em 23 de setembro de 1985. A minissérie e a segunda temporada seriam somadas para o "número mágico" de 65, ideal para um desenho exibido de segunda a sexta, para as reprises e para exibição em canais que não o compraram da primeira vez. Infelizmente, perto do final da segunda temporada, a audiência caiu muito, o que levou a Tonka a cancelar a produção da já prevista terceira temporada. O último episódio inédito dos GoBots iria ao ar em 13 de dezembro de 1985, mas os roteiros não usados para a terceira temporada seriam aproveitados para um filme para o cinema, chamado Challenge of the GoBots: Battle of the Rock Lords, que estrearia em 21 de março de 1986, e que era um crossover com outra linha de brinquedos da Tonka, os Rock Lords, que pedem a ajuda dos Guardiões para salvar seu planeta de um ataque do vilão Magmar. O filme daria um novo fôlego à linha de brinquedos, que teria novos lançamentos até 1987.

Em 1991, a Hasbro compraria a Tonka, e passaria a ser dona tanto dos Transformers quanto dos GoBots - como os brinquedos eram licenciados pela Bandai para a Tonka, porém, a Hasbro teria direito somente aos nomes, à história e à aparência dos personagens do desenho, sem poder relançar os brinquedos. A Hasbro jamais usou esses direitos, embora tenha usado o nome GoBots para várias linhas de brinquedos envolvendo Transformers, a primeira lançada em 1995, que contava com alguns Transformers, como Optimus Prime, Bumblebee, Ironhide e Sideswipe, ao estilo Hot Wheels, feitos de metal e do mesmo tamanho. A única aparição dos GoBots após a compra pela Hasbro foi em uma série em quadrinhos lançada em 2018 pela IDW, que teve apenas cinco edições - curiosamente, essa é a única série em quadrinhos dos GoBots, já que, diferentemente do que ocorreu com os Transformers, a Tonka não encomendou uma junto com o desenho.

O segundo desenho que veremos hoje eu não me lembro se chegou a passar em algum canal de TV daqui. Eu me lembro que o assisti em VHS, porque ele estava no acervo da locadora do meu bairro, eu adorava dinossauros e, quando vi que era um desenho com dinossauros, pedi pro meu pai alugar. Trata-se de Dino-Riders.

A história de Dino-Riders começa no futuro, no planeta Valoria, que vivia em paz até a chegada da Aliança Rulon, alienígenas predatórios que invadem planetas, os exploram até a exaustão e o abandonam. Apesar de tecnologicamente avançados, os Valorians não conseguiam derrotar os Rulons, de forma que um grupo foi reunido a bordo da nave mais avançada de Valoria, com o objetivo de se lançar ao espaço em busca de ajuda. Só que os Rulons perceberam, e enviaram uma de suas próprias naves para persegui-los e destruí-los. Ao serem atacados, os Valorians decidiram usar uma tecnologia experimental, chamada STEP (da sigla em inglês para Projetor de Energia no Espaço-Tempo), para tentar escapar; alguma coisa deu errado, porém, e eles foram lançados através do tempo e do espaço, vindo para no planeta Terra, há 65 milhões de anos, na época dos dinossauros - e, como a nave dos Rulons havia acabado de prender a nave dos Valorians em um raio-trator quando o STEP foi acionado, acabou sendo trazida junto com eles.

Ao chegar na Terra, a nave dos Valorians se acidentou, de forma que era impossível para eles voltarem para casa. Através de um projetor de ondas mentais, eles conseguiram fazer amizade com vários dinossauros, com os quais conversavam telepaticamente e usaram para construir uma espécie de fortaleza e uma mini-sociedade onde Valorians e dinossauros coexistem. A nave dos Rulons também se acidentou, do outro lado do vale, e, como eles não possuem o projetor de ondas mentais, escravizaram um grupo de dinossauros e os equiparam com armas e armaduras, pois, igualmente incapazes de voltar para casa, eles decidiriam levar a cabo sua missão e destruir os Valorians - que, querendo começar uma vida nova, mudariam seu nome para Dino-Riders.

Diferentemente de outros desenhos dos anos 80, nos quais cada equipe tem meia dúzia de personagens, a nave dos Valorians trazia mais de vinte pessoas, divididas em duas equipes, uma científica e uma militar, com os militares sendo coletivamente conhecidos como Comandos. Os principais eram Questar, o líder da expedição; Mind-Zel, ancião cego que tem um sexto sentido que permite perceber a posição de pessoas e objetos ao seu redor, o que faz dele um especialista em combate corpo a corpo; Serena, a neta de Mind-Zel, que tem um sexto sentido que lhe diz quando alguém está em perigo e o poder de curar ferimentos com o toque de suas mãos; Gunnur, veterano de guerra responsável por criar as estratégias contra os Rulons e treinar os Valorians para usar os dinossauros como montaria; Astra, o líder dos Comandos, que antes da invasão era professor na Universidade de Valoran, e chegou a ser professor de Questar; Bomba, especialista em explosivos; Kameelian, especialista em camuflagem; Turret, cientista responsável pelo desenvolvimento do STEP, que tem esperança de conseguir consertar a nave para que eles retornem a Valoria; Yungstar, guerreiro jovem e impulsivo; e Lahd, o mais novo da expedição, um adolescente que frequentemente tenta provar que já tem idade para combater os Rulons. Oa Valorians fariam amizade com uma tribo de Cro-Magnons, da qual os três principais são o líder Zar, a curandeira Maya e o jovem Kub - que são mais ou menos equivalentes a Questar, Serena e Yungstar.

Os Valorians têm aparência humana, mas os Rulons são monstruosos, se parecendo com animais antropomórficos. Eles também são um grupo grande, de mais de trinta, embora a maioria só sirva como soldado genérico nas batalhas, não participando das histórias. Seu líder é Krulos, que se parece com um sapo de armadura e está disposto a tudo para destruir os Valorians antes de tentar retornar para seu próprio tempo e lugar. Outros Rulons de destaque são Rasp, segundo em comando, que tem cabeça de cobra e conspira para assumir o lugar de Krulos; Hammerhead, que tem cabeça de tubarão-martelo e é o comandante do Exército Rulon; Antor, que se parece com uma formiga e é o principal estrategista dos Rulons; Krok, que se parece com um crocodilo e é capacho de Krulos; Skate, que se parece com uma arraia marinha; e Lokus, que se parece com um gafanhoto. Os Rulons fariam aliança com uma tribo de Neandertais, que são os inimigos jurados dos Cro-Magnons, e decidem ajudá-los na luta contra os Valorians em troca de sua ajuda para escravizar seus oponentes pré-históricos; o único Neandertal de destaque é o líder, Grom, que comanda sua tribo através do medo.

Em um esquema incomum para um desenho dos anos 1980, Dino-Riders teve seus dois primeiros episódios lançados diretamente em VHS, o primeiro em 1987, o segundo em 1988. Como a linha de brinquedos, lançada também em 1988, teve boas vendas, mais 11 episódios foram encomendados, para fechar uma temporada de 13 (número mínimo para um desenho semanal); assim, os dois primeiros episódios seriam exibidos pela primeira vez na TV respectivamente em 1 e 8 de outubro de 1988, com os "inéditos" estreando em 15 de outubro. Infelizmente, o desenho não teve boa audiência e não foi renovado para uma segunda temporada, com seu último episódio indo ao ar em 24 de dezembro. O desenho era produzido pela Marvel, em parceria com o estúdio sul-coreano Hanho Heung-Up, e sua história seria criada por um dos mais famosos roteiristas da Marvel, Gerry Conway, que co-escreveria o primeiro episódio com sua então esposa Carla.

Os dois primeiros episódios seriam criados, como de costume, para promover uma linha de brinquedos, lançada pela Tyco. Assim como os Sectaurs, os brinquedos eram vendidos em conjuntos, com cada conjunto sendo composto por um boneco e um dinossauro (que não tinha nome próprio), e os dinossauros podendo ser "pequenos" ou "grandes" - sendo que os grandes (tiranossauro, triceratops, diplodoco e torossauro) eram motorizados, sendo movidos a pilha, caminhando e abrindo e fechando a boca quando ligados, enquanto os pequenos (monoclono, estiracossauro, pteranodonte, pterodáctilo, quetzacoatlo, anquilossauro e dois dinonicos, um Valorian e um Rulon) eram simplesmente articulados. Os dinossauros seriam criados pelo ilustrador William Stout, e eram considerados absurdamente realísticos em relação ao que se sabia sobre dinossauros na época, ao ponto de o Smithsonian Institution se impressionar e fechar um contrato com a Tyco para o lançamento de uma série de brinquedos apenas com dinossauros, chamada Dinosaur and other Prehistoric Reptile Collection.

Como os conjuntos, principalmente os com dinossauros grandes, eram bem caros em relação aos demais brinquedos da época, a Tyco também lançaria oito conjuntos apenas de bonecos, cada um com um Valorian e um Rulon. Mesmo com o preço elevado, porém, as vendas seriam boas, e, ao contrário do desenho, a linha de brinquedos seria renovada para uma segunda série, composta por dez conjuntos de bonecos com dinossauros, sendo quatro grandes (brontossauro, estegossauro, paquicefalossauro e parassaurolofo) e seis pequenos (edmontônia, dimetrodon, estrutiomimo, protocerátops, kentossauro e placérias), mais seis Comandos, cujos bonecos não vinham com dinossauros, mas com várias armas e equipamentos intercambiáveis; também seriam lançados oito conjuntos de dois bonecos sem dinossauros, sempre um Valorian e um Rulon. O brontossauro seria o único dinossauro grande a não ser motorizado, mas, em compensação, era um playset, sendo bem maior que todos os outros, vindo com nada menos que três bonecos (um deles Serena, que ficou de fora da primeira série) e três ranforrincos.

As vendas da linha de brinquedos eram tão boas que, além de colocar em produção uma terceira série, a Tyco encomendaria à Marvel um novo episódio para ser lançado diretamente em VHS. Chamado Dino-Riders in the Ice Age, ele acompanhava um pequeno grupo de Valorians e Rulons que, após um novo incidente com o STEP, vai parar na Era Glacial. Com 45 minutos de duração (os demais episódios tinham 22 minutos cada), esse episódio especial seria lançado em 1990, junto com a nova série de brinquedos, da qual as estrelas eram mamíferos da Era Glacial, todos grandes, peludos e acompanhados de um boneco cada: mamute (o único motorizado), megatério, arqueotério e tigre dentes-de-sabre. A série também incluía três conjuntos de bonecos com dinossauros pequenos (paquirrinssauro, chasmossauro e um quetzacoatlo Rulon, já que o da primeira série era Valorian) e contava com seis conjuntos de dois bonecos cada, mais uma vez sempre um Valorian e um Rulon. Por alguma razão, a terceira série de brinquedos foi produzida em número limitado, e era difícil de ser encontrada; depois dela, a linha foi cancelada de vez.

Além do desenho e da série de brinquedos, Dino-Riders também teve uma minissérie em quadrinhos, publicada pela Marvel em 1989, também com roteiro de Conway. A minissérie ficaria famosa por ser muito mais "adulta" que o desenho; um dos temas recorrentes era que a convivência entre os Valorians no novo planeta não era pacífica, com muitos dos membros da equipe não indo com a cara uns dos outros e conflitos frequentemente surgindo dentro do próprio grupo.
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segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Escrito por em 5.1.15 com 1 comentário

Smurfs

Recentemente, eu assisti ao filme dos Smurfs. Ainda não havia me interessado em assisti-lo durante esse tempo todo porque, quando soube que a história envolvia os Smurfs atravessando um portal e vindo parar em Nova Iorque, achei que seria um novo Mestres do Universo - aquele filme com o Dolph Lundgren no qual o He-Man, o Esqueleto e mais alguns personagens, incluindo um anão que nem existia no desenho, atravessam um portal e vêm parar na Califórnia. Sério, por que insistem em fazer isso? Qual a dificuldade de se fazer um filme do He-Man ambientado em Etérnia?

Digressões à parte, eu nem achei o filme dos Smurfs ruim. Na verdade, achei até bastante divertido. E assisti-lo, como vocês devem ter imaginado, me deixou com vontade de escrever um post sobre os Smurfs, até porque eu gostava bastante do desenho quando era criança. Assim, a conclusão inevitável é a de que hoje é dia de Smurfs no átomo.


Duas coisas que eu aposto que vocês não sabiam sobre os Smurfs: primeiro, eles não foram inventados nos Estados Unidos, mas na Bélgica, e, segundo, eles não foram criados nos anos 1980, mas em 1958. Seu criador é o cartunista belga Peyo, cujo nome verdadeiro era Pierre Culliford. Na década de 1950, Peyo trabalhava para a revista Spirou, que publicava uma história em quadrinhos chamada Johan et Pirlouit, da qual Peyo era criador, roteirista e desenhista. Ambientadas em um mundo de fantasia medieval, as histórias eram protagonziadas por Johan, um jovem pajem que almeja se tornar cavaleiro, e seu melhor amigo, o anão Pirlouit. Em 1958, Johan e Pirlouit protagonizaram uma história na qual buscavam encontrar uma flauta mágica, na qual conheceram o mago Homnibus. Seguindo as instruções do mago, eles encontrariam uma estranha criatura, um homenzinho azul de poucos centímetros de altura e vestido de branco, que se identificou como um "Schtroumpf", e os levou até sua aldeia, onde viviam vários outros Schtroumpfs, incluindo um líder, que tinha uma espessa barba branca e vestia vermelho - pelo simples fato de que Peyo achou que a barba branca não combinava com a roupa branca.

Essa história, publicada em 23 de outubro de 1958 e hoje considerada a primeira dos Smurfs, fez um enorme sucesso, e logo os leitores começaram a pedir por mais aventuras com a participação das criaturinhas. Assim, em 20 de janeiro de 1959, a Spirou publicaria, pela primeira vez, uma história solo dos Smurfs, a qual se seguiriam não só muitas mais, mas também o lançamento de muito merchandising associado, principalmente brinquedos. Em pouco tempo, os Smurfs se tornaram um grande sucesso não só entre as crianças, mas também entre adultos.

E como os Schtroumpfs viraram Smurfs? Peyo teve a ideia de criá-los após um jantar com seu amigo André Franquin. A Bélgica, para quem não sabe, possui dois idiomas oficiais, o francês e o holandês, sendo que, dependendo da região do país, um dos dois é predominante. Peyo nasceu em Bruxelas, onde o francês é predominante, mas, por força da família de sua mãe, era mais acostumado com o holandês, enquanto Franquin praticamente só falava francês. Durante o jantar, Peyo quis pedir para que Franquin passasse o sal, mas se esqueceu de como era "sal" em francês (sel; antes que alguém pergunte, em holandês é zout). Por algum motivo, ele resolveu inventar, e pediu "por favor, passe o schtroumpf". Franquin achou graça e lhe deu o sal, dizendo "aqui está o schtroumpf; depois que você schtroumpfar, me schtroumpf de volta". Peyo foi para casa pensando naquela "conversa", e decidiu criar os Schtroumpfs, criaturinhas que substituem várias palavras de seu dia a dia pela palavra "schtroumpf".

Mas "Schtroumpf" era uma palavra de som francês, e, vivendo na Bélgica, Peyo precisaria publicar suas histórias também em holandês - e, se fosse seguir as regras de pronúncia do holandês, o som de "schtroumpf" sairia completamente diferente. Assim, ele criaria uma palavra parecida, Smurfen, para batizar os personagens em holandês. Como Smurf era um nome mais simples que Schtroumpf, acabaram optando por esse nas versões internacionais que começaram a ser lançadas na Europa nos anos seguintes.

Vale comentar, também, que, por causa de sua origem holandesa, na grande maioria dos países o nome dos Smurfs é pronunciado como nós o pronunciamos ("ismúrfe", que é a pronúncia em holandês), enquanto nos de língua inglesa a pronúncia é um pouco diferente ("ismârfe"). Na Alemanha, eles são conhecidos como Schlümpfe, porque strumpf, em alemão (que se pronuncia exatamente como "schtroumpf" em francês) significa "meia", daquela de calçar no pé. Na Espanha e América Latina eles são conhecidos como Pitufos, pois são parecidos com pequenos duendes do folclore da Catalunha chamados "patufets". E, apenas para completar as informações linguísticas, quando foram lançados em histórias em quadrinhos no Brasil, antes do desenho, eles se chamava Strunfs, e em Portugal, até o lançamento do filme, eram conhecidos como Estrumpfes.

Os Smurfs fizeram tanto sucesso que permitiram a Peyo abrir seu próprio estúdio em 1960, através do qual ele não somente trabalharia em suas próprias histórias, mas também daria chance a novos roteiristas e desenhistas belgas. Peyo atuava mais como um gerente e supervisor, e praticamente só trabalhava nas histórias de Johan et Pirlouit, com as histórias dos Smurfs ficando a cargo de diferentes artistas. A parte de editoração ficava a cargo de seu filho, Thierry, enquanto a parte do merchandising ficava a cargo de sua filha, Véronique. A publicação era feita pela editora Dupuis.

Originalmente, as histórias dos Smurfs eram publicadas em álbuns, forma comum de publicação na Europa, através da qual também eram publicadas, por exemplo, as histórias de Asterix e Tintin. Esse tipo de álbum não tem nada a ver com figurinhas, sendo uma espécie de "livro em quadrinhos", com capa dura e tudo - e, assim como todo livro, não tem periodicidade definida, sendo lançado apenas quando fica pronto, não importa quanto tempo leve. Ao todo, desde 1960, 30 álbuns dos Smurfs já foram publicados, 16 deles tendo a participação de Peyo como roteirista, desenhista ou ambos. Histórias "soltas", que não faziam parte das dos álbuns, também seriam publicadas na Spirou, como parte de uma revista dos Smurfs, lançadas na Europa na década de 1970, e como tirinhas de jornal em vários países.

Os Smurfs são criaturinhas bem simples: todos eles são azuis, pequeninos (oficialmente, um Smurf tem "a altura de três maçãs", mas eles são, na verdade, bem menores que isso, com por volta de dez centímetros de altura; isso ocorre porque a expressão em francês haut comme trois pommes é apenas uma expressão idiomática usada para dizer que uma coisa é pequena, mas acabou sendo traduzida literalmente como se fosse a medida da altura real dos Smurfs) e vestem uma espécie de meia-calça (já que é uma calça com os sapatos já presos no final das pernas) com um buraco atrás para passar um rabinho redondo, e um barrete frígio, espécie de chapéu mole de origem turca, que acabou se tornando um símbolo de liberdade após ser usado pelos republicanos durante a Revolução Francesa. A roupa de todos os Smurfs é branca, exceto a do Papai Smurf, o líder, que usa roupa vermelha.

A princípio, todos os Smurfs são homens, e, na aldeia, originalmente, existiam 100 deles - 99 Smurfs mais o Papai Smurf. Cada Smurf é batizado de acordo com sua principal característica - o Desastrado é desastrado, o Ranzinza reclama de tudo, o Gênio é mais inteligente que os demais - e alguns deles possuem alterações na roupa para refletir essas características - o Habilidoso usa uma jardineira ao invés da meia-calça e tem um lápis atrás da orelha, o Vaidoso tem uma flor no chapéu, o Cozinheiro usa chapéu de chef e avental. Todos os Smurfs vivem na Aldeia dos Smurfs, em casas escavadas no interior de cogumelos, e se alimentam, principalmente, de smurfrutinhas, pequenas frutas redondas que crescem na região. Outra característica intrínseca dos Smurfs é sua linguagem: eles tendem a substituir qualquer adjetivo ou verbo pela palavra "smurf", criando frases como "não smurfe a minha casa" ou "esse bolo está muito smurf".

A maioria das histórias dos Smurfs tem aventuras envolvendo a vida na Aldeia, como uma barragem que corre o risco de se romper ou a colheita de smurfrutinhas sendo menor que o esperado; em algumas delas, porém, eles enfrentam um inimigo terrível: o feiticeiro Gargamel, que vive em uma choupana próxima e quer usar os Smurfs em uma fórmula que o permitirá transformar qualquer material em ouro. Gargamel descobriu os Smurfs acidentalmente, e não consegue encontrar sua aldeia porque ela está protegida por um encantamento, segundo o qual nenhum humano consegue chegar até ela a menos que seja levado até lá por um Smurf. Gargamel é atrapalhado e não é muito esperto, mas realmente possui poderes mágicos - tanto que conseguiu criar a Smurfette, originalmente a única Smurf do sexo feminino, para se infiltrar na Aldeia e levá-lo até lá; seu plano não deu certo, porém, e a Smurfette acabou adotada pelos Smurfs, se tornando um deles. Gargamel também possui um gato, Cruel, que em alguns momentos é mais esperto que ele, e que parece querer comer os Smurfs ao invés de entregá-los a seu dono.

Durante uns vinte anos, os Smurfs permaneceram restritos a um cantinho da Europa - Bélgica, Holanda, Luxemburgo e França - com a internacionalização de seu sucesso ocorrendo apenas no final da década de 1970, e motivada pela gravação, em 1977, de um compacto com duas músicas, Ga je mee naar Smurfenland (algo como "quem quer ir à Terra dos Smurfs?") e o Tema dos Smurfs (na-na-naná-naná), pelo cantor holandês Pierre Kartner, usando o pseudônimo de Father Abraham. Originalmente gravado para ser apenas mais um merchandising associado, o compacto faria um enorme sucesso, e chegaria ao topo da lista dos mais vendidos em nada menos que 15 países europeus e no Japão.

Um ano antes do lançamento do compacto, em 1976, o produtor norte-americano Stuart R. Ross viajaria à Bélgica e teria contato com as histórias em quadrinhos e diversos outros produtos que retratavam os Smurfs. Vendo uma oportunidade de negócios, ele entraria em contato com Peyo para conseguir uma licença para produzir merchandising dos Smurfs nos Estados Unidos. A primeira linha de brinquedos seria lançada pela empresa californiana Wallace Berrie and Co. quase que simultaneamente ao lançamento do compacto nos Estados Unidos, o que faria com que ela fosse um grande sucesso, já que as crianças, adorando a música, pediriam para seus pais comprar também os brinquedos. Uma dessas crianças seria a filha do presidente da rede de televisão NBC, Fred Silverman, que tinha uma grande coleção de bonecos, o primeiro comprado por ele durante uma viagem por acaso, ao achar que seria um presente diferente para ela. Ao observar os bonecos e o interesse que as crianças demonstravam por eles, Silverman chegaria à conclusão de que um desenho dos Smurfs seria a adição perfeita à sua grade de programação das manhãs de sábado. Ele entraria em contato com os estúdios Hanna-Barbera, e, assim, nasceria o desenho dos Smurfs.

O desenho era uma co-produção da Hanna-Barbera com o estúdio belga SEPP, e tinha Peyo como consultor das histórias - a maioria das histórias teria roteiro original, aprovado por Peyo, com apenas algumas sendo adaptações das histórias já existentes. A primeira temporada, que estrearia em 12 de setembro de 1981, teria 26 episódios, mas em um esquema bastante curioso: foram produzidos 13 episódios de 22 minutos cada e 26 episódios de 11 minutos cada, sendo que dois episódios de 11 minutos eram sempre exibidos juntos e contavam, oficialmente, como um único episódio (por isso o total de 26 episódios, e não 39). Além disso, a cada dia eram exibidos dois episódios (na verdade três, já que eram sempre um de 22 e dois de 11 minutos por dia), em um bloco de 40 minutos (33 de desenho e 7 de anúncios), o que fez com que toda a primeira temporada fosse exibida em apenas 13 sábados, se encerrando em 5 de dezembro.

Mesmo com esse esquema maluco, o desenho fez um enorme sucesso, se tornando uma das maiores audiências da história das manhãs de sábado e tranformando os Smurfs em verdadeiros ícones da cultura pop. Para comemorar, a NBC encomendou um "Especial de Primavera", um desenho de 45 minutos que foi ao ar em 8 de abril de 1982, e uma segunda temporada, de mais 36 episódios (na verdade, 27 episódios de 22 minutos cada e 18 episódios de 11 minutos cada, com mais uma vez os de 11 minutos exibidos dois a dois e cada dupla contando como um único episódio). Para aproveitar a audiência, a NBC decidiria aumentar o tamanho do bloco para 80 minutos (66 de desenhos e 14 de anúncios), exibindo três episódios por sábado (sendo que, na verdade, podiam ser até seis, se fossem três duplas de episódios de 11 minutos), com toda a temporada sendo exibida em 12 sábados, de 18 de setembro a 4 de dezembro de 1982. Em 12 de dezembro iria ao ar mais um episódio de 45 minutos, um Especial de Natal.

Mais um episódio especial de 45 minutos iria ao ar em 13 de fevereiro de 1983, um Especial de Dia dos Namorados (que, nos Estados Unidos, é comemorado no dia 14 de fevereiro, e não 12 de junho como aqui). Em 17 de setembro, estrearia a terceira temporada, com mais 32 episódios (na verdade 9 episódios de 22 minutos e 46 episódios de 11 minutos cada), mais uma vez exibidos três a três, exceto em 22 de outubro, quando só foram exibidos dois. Um novo Especial de Dia dos Namorados, de 45 minutos, foi ao ar em 13 de fevereiro de 1984, seguido de um Especial das Olimpíadas, de 30 minutos, em 20 de maio (para aproveitar que as Olimpíadas daquele ano seriam em Los Angeles, nos Estados Unidos) e a estreia da quarta temporada, em 15 de setembro, com mais 26 episódios (ou 4 de 22 minutos e 44 de 11 minutos), mais uma vez exibidos de três em três, exceto no último dia da temporada, 17 de novembro, quando só foram exibidos dois.

A quinta temporada traria novos personagens, os Smurflings, Smurfs que foram rejuvenescidos por magia e se tornaram crianças. Os Smurflings existiam nas histórias em quadrinhos, mas a Hanna-Barbera achou melhor não introduzi-los de pronto para ter uma espécie de carta na manga para quando quisesse colocar uma novidade no desenho; isso faria, por outro lado, com que muita gente achasse que os Smurflings foram criados especialmente para o desenho, e até com que protestassem contra sua inclusão. Além dos Smurflings, a quinta temporada introduziu o Vovô Smurf, que tem uma barba ainda maior que a do Papai Smurf, usa óculos e uma roupa amarela; e nela o Bebê Smurf, personagem introduzido ainda na primeira temporada, mas praticamente esquecido desde então, passaria a ter um papel mais ativo. A quinta temporada teria apenas 24 episódios (8 de 22 minutos e 32 de 11 minutos) exibidos três a três em oito datas, entre 21 de setembro e 9 de novembro de 1985.

Enquanto a quinta temporada estava no ar, a Hanna-Barbera produziu um desenho dos Smurfs para o cinema, com 60 minutos de duração, chamado A Grande Aventura dos Smurfs (Smurfquest, no original). Problemas com a distribuição, entretanto, cancelaram o lançamento, e o desenho acabou sendo exibido na TV, em 1o de janeiro de 1986. Mais tarde, Smurfquest seria bastante editado e transformado em quatro episódios de 11 minutos cada, exibidos na estreia da sexta temporada junto com outro episódio, O Novo Emprego de Gargamel. Ao todo, a sexta temporada teria 36 episódios (7 de 22 minutos e 58 de 11 minutos, incluindo as 4 partes de Smurfquest), exibidos três a três entre 13 de setembro e 29 de novembro de 1986.

A audiência da quinta e da sexta temporadas seria bem menor que a das quatro primeiras, mas, mesmo assim, a NBC apostava no desenho, tanto que encomendou mais uma temporada completa para o ano seguinte. A sétima temporada teria mais 36 episódios (6 de 22 minutos e 60 de 11 minutos), e, assim como a sexta, começaria com um episódio especial de quatro partes de 11 minutos cada, Os Smurfs Selvagens. Os episódios da sétima temporada seriam exibidos três a três em 12 datas, entre 19 de setembro e 5 de dezembro de 1987. Em 13 de dezembro de 1987, iria ao ar mais um Especial de Natal, dessa vez com apenas 30 minutos.

A audiência da sétima temporada foi ainda mais baixa, e a SEPP decidiu romper a parceria com a Hanna-Barbera, que, por sua vez, estabeleceria uma nova com a Lafig S/A. A parceria não se mostraria tão vantajosa, entretanto, e a oitava temporada, que estrearia em 10 de setembro de 1988, teria apenas 16 episódios (8 de 22 minutos e 16 de 11 minutos), exibidos dois a dois até 29 de outubro. A audiência, mais uma vez, seria bem baixa.

Para tentar salvar o desenho, a NBC propôs mudanças, especificamente pedindo para que o desenho se tornasse educativo. Assim, na nona temporada, que estreou em 9 de setembro de 1989, os Smurfs se tornariam viajantes do tempo, testemunhando vários acontecimentos importantes da história da humanidade enquanto ensinavam às crianças os mais diferentes assuntos. A nona temporada teve 24 episódios (8 de 22 minutos e 32 de 11 minutos) exibidos dois a dois até 2 de dezembro. Como a audiência continuava despencando, a NBC optou por cancelar a série. Curiosamente, no ano seguinte, toda a programação das manhãs de sábado, originalmente dedicada ao público infantil, seria substituída por uma nova, dedicada ao público adolescente e capitaneada pela série Saved By The Bell.

O desenho da Hanna-Barbera é o mais famoso, mas não foi o primeiro: em 1965 foi produzido um longa de animação em preto e branco para o cinema, com 87 minutos, composto de cinco segmentos que adaptavam cinco histórias em quadrinhos dos Smurfs, chamado Les Aventures des Schtroumpfs e produzido pela Dupuis. Em 1976, os estúdios Belfont lançariam um segundo longa-metragem para o cinema, Os Smurfs e a Flauta Mágica, de 74 minutos e a cores, que adaptava a aventura de Johan e Pirlouit na qual os Smurfs estrearam, ampliando seu papel e os transformando em protagonistas. Esse longa só seria exibido nos cinemas norte-americanos em 1983, o que fez com que muitos pensassem que ele era uma produção da Hanna-Barbera e parte da cronologia do desenho.

Após o fim do desenho da Hanna-Barbera, os Smurfs passaram mais uns vinte anos meio escondidos, sendo vistos apenas em reprises, até que, um dia, a Sony resolveu aproveitar a onda de ressurreição de personagens de desenhos antigos em filmes com atores - que já havia levado à produção de filmes como Transformers, G.I. Joe e Zé Colmeia - para lançar um filme dos Smurfs. Dirigido por Raja Gosnell (de Nunca Fui Beijada e Scooby-Doo, mais um filme dessa onda), o filme, lançado em 29 de julho de 2011, trazia atores de carne e osso em cenários reais contracenando com Smurfs de computação gráfica. E, por alguma razão, era ambientado na Nova Iorque dos dias atuais, e não na Aldeia dos Smurfs ou em seus arredores como o desenho.


No filme, ao fugir de um ataque de Gargamel (Hank Azaria), que deseja extrair sua essência para amplificar seus poderes mágicos, deixando de ser um feiticeiro desastrado para se tornar um mago genuíno, Papai Smurf (voz de Jonathan Winters, que também o dublava no desenho), Desastrado (voz de Anton Yelchin), Gênio (voz de Fred Armisen), Arrojado (voz de Alan Cumming), Ranzinza (voz de George Lopez) e Smurfette (voz da cantora Katy Perry) passam acidentalmente por um portal e vêm parar na Nova Iorque dos dias atuais, onde fazem amizade com Grace (Jayma Mays) e Patrick Winslow (Neil Patrick Harris). Patrick trabalha para a empresa de cosméticos Anjelou, e está sendo pressionado por sua chefe, Odile (Sofía Vergara), para criar sua nova campanha publicitária; ainda assim, os Smurfs conseguem convencê-lo a ajudá-los, pois possuem um tempo-limite para voltar para casa, sob o risco de ficarem presos em Nova Iorque para sempre. As coisas se complicam quando Gargamel e Cruel (voz de Frank Welker, um dos maiores dubladores de desenhos dos Estados Unidos, que dublou, dentre outros, Megatron em Transformers, Darkseid nos Superamigos e Fred em Scooby-Doo) os seguem pelo portal e montam uma base de operações em nosso mundo, planejando roubar a essência dos Smurfs e dominar o planeta com seus poderes mágicos.

O filme fez um relativo sucesso e gerou uma continuação, lançada em 31 de julho de 2013 e também dirigida por Gosnell. Dessa vez, Gargamel cria duas criaturas semelhantes aos Smurfs, mas de cor cinza, Vexy (voz de Christina Ricci) e Hackus (voz de J.B. Smoove), a quem chama de Danadinhos. O vilão planeja extrair a essência dos Danadinhos para ampliar sua magia como faria com os Smurfs, mas isso não dá certo porque eles não são azuis. Ele bola, então, um plano maligno: sequestrar a Smurfette - que, no universo do filme, originalmente também era uma Danadinha, mas foi transformada em Smurf por uma magia do Papai Smurf - e obrigá-la a revelar a ele a fórmula que transforma Danadinhos em Smurfs, conseguindo, assim, um suprimento ilimitado de essência sem precisar mais capturar os Smurfs. Gargamel traz a Smurfette para a Paris dos dias atuais, e o Papai Smurf decide montar um grupo para resgatá-la, incluindo ele mesmo, Desastrado, Ranzinza e Vaidoso (voz de John Oliver). Ao chegar novamente em nosso mundo, eles terão a ajuda de Grace, Patrick e do atrapalhado padrasto de Patrick, Victor Doyle (Brendan Gleeson).

Além dos dois filmes, a Sony também foi responsável por dois desenhos de 22 minutos cada, produzidos em computação gráfica e lançados diretamente em DVD. O primeiro, lançado em 2011, é um Especial de Natal, e adapta a história Um Conto de Natal, de Charles Dickens (aquela dos Fantasmas do Natal Passado, Presente e Futuro) para a Aldeia dos Smurfs. O segundo, de 2013, é um Especial de Halloween, e adapta A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, de Washington Irving. Todos os personagens dos Especiais (incluindo Gargamel e Cruel) possuem os mesmos dubladores dos filmes, exceto Smurfette, dublada por Melissa Sturm, já que Katy Perry não conseguiu conciliar sua agenda de shows com as sessões de dublagem, e o Papai Smurf, que no Especial de Halloween é dublado por Jack Angel, pois Jonathan Winters faleceu em abril de 2013, pouco depois de encerrar sua participação em Os Smurfs 2.

O sucesso dos filmes levou a Sony a discutir com os estúdios de Peyo (que faleceu em 24 de dezembro de 1992, de infarto, aos 64 anos) a possibilidade de se produzir uma nova série animada, dessa vez em computação gráfica como os especiais. Um longa-metragem de animação em computação gráfica também está previsto para ser lançado em 2016, e Gosnell planeja dirigir um terceiro filme, que ainda não tem data de lançamento definida, para "fechar sua trilogia". Após anos de reclusão, parece que as coisas se animaram na Aldeia dos Smurfs.
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